Brasileiros que atuam por apps são tema de debate sobre modelo de trabalho no país; nova pesquisa traz dados sobre jornada e renda média desses profissionais

A ex-empresária Débora Bráz ficou 5 meses em coma após sofrer um acidente vascular cerebral e ter um aneurisma diagnosticado. Perdeu tudo; dinheiro, empresas, carro e outros bens materiais.

Depois de recuperar a saúde, Débora decidiu recomeçar a vida como motorista de aplicativo pela plataforma da 99. E diz que deu a volta por cima, tanto na saúde como em sua estabilidade. Essa trajetória foi acompanhada de perto por seus familiares e amigos. Tanto que a agora motorista chegou a ser presenteada por eles com uma festa de aniversário de 50 anos com tema da 99. “Essa opção que fiz marcou o recomeço da minha vida. Foi realmente um ponto de virada”, afirma.

Assim como Débora, milhões de brasileiras e brasileiros ingressaram na chamada nova economia, de matriz altamente tecnológica. São motoristas parceiros, entregadores, manicures, pedreiros e eletricistas, entre outros. Eles talvez passem esse Dia do Trabalho trabalhando, mas justamente por meio das plataformas é que fazem parte da população economicamente ativa, geradora de renda direta e indireta e força de trabalho que aumenta a arrecadação de impostos.

Débora Bráz

“O trabalho com intermediação de aplicativos está presente em todo o mundo. Ele oferece inovação, ferramentas adicionais de segurança, flexibilidade e autonomia para trabalhar. E isso está começando a ser reconhecido pelas políticas públicas globais”, afirma Rodrigo Ferreira, gerente de Relações Institucionais da 99.

O governo federal está compondo uma comissão tripartite envolvendo representações de trabalhadores, empresas e da União para discutir como construir uma regulamentação que leve em conta as especificidades dessa nova relação de prestação de serviço. Um dos temas que devem ser debatidos é a seguridade social.

O debate sobre o trabalho na nova economia impactará milhões de famílias brasileiras que hoje utilizam ganhos obtidos por intermediação de plataformas. “Por isso é importante que essa discussão seja conduzida de forma a atender todas as partes envolvidas e reduzir possíveis efeitos negativos para a sociedade como um todo”, explica Ferreira.

Ferreira acompanha de perto essa discussão preparatória e tem sempre à mão as estatísticas e diagnósticos sobre motoristas e usuários de aplicativos da 99. “Muito se fala sobre esses profissionais que trabalham com intermédio de aplicativos, mas pouco se sabia, com dados atualizados. São pessoas, em sua maioria, com ensino médio completo e que ganham mais de dois salários mínimos fazendo jornada menor”, disse.

Ele se refere à mais recente pesquisa nacional do setor feita pelo Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento) sobre o trabalho de motoristas e entregadores autônomos por meio de aplicativos no país. O estudo, divulgado dias atrás, analisou pela primeira vez dados de corridas e entregas fornecidos por 99, iFood, Uber e Zé Delivery, empresas associadas à Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia).

Segundo o estudo, a flexibilidade de horários é o principal atrativo da atividade em aplicativos para os trabalhadores, seguido dos ganhos. Atualmente, 48% dos entregadores e 37% dos motoristas têm outros trabalhos, dos quais cerca de 50% e 40% com carteira assinada, respectivamente. A maioria absoluta dos trabalhadores (80% dos entregadores e 60% dos motoristas) diz que pretende continuar trabalhando com as plataformas.

“Consegui mobiliar minha casa inteirinha, novamente, resgatei o meu direito de ter o carro próprio e agora tenho uma vida confortável, não de rica, mas bem confortável para mim. Supre todas as minhas vontades e vaidades”, afirma Débora. Ela diz que é apaixonada pelo que faz e que até hoje tem contato com os dois primeiros passageiros que atendeu.

Assim como Débora, milhões de brasileiros e brasileiras atuam fora do emprego formal ou de maneira híbrida. Segundo Ferreira, esses profissionais, que geram ganhos para suas famílias e com isso movimentam a economia do país, precisam agora de um olhar mais atento.

“A 99, por exemplo, defende um regime de proteção a esses parceiros autônomos por meio da Seguridade Social, pois são trabalhadores como os demais, só estão em um novo formato de modelo de exercício de atividade remunerada. Aí está o ponto crucial do debate: incluir essa importante parcela da população com isonomia e manter a segurança jurídica das empresas que facilitam o dia a dia e o aumento de ganhos dessas pessoas”, disse.

JORNADA MENOR, RENDA MAIOR
A jornada média de trabalho de motoristas que conseguem corridas com a intermediação feita por aplicativos, por exemplo, está entre 22 e 31 horas semanais, enquanto para entregadores oscila entre 13 e 17 horas semanais, segundo pesquisa do Cebrap. O engajamento varia muito entre os trabalhadores: alguns têm as plataformas como trabalho exclusivo, outros como forma de ganhos complementares.

Atualmente, segundo a pesquisa Cebrap, cerca de 1,660 milhão de pessoas no Brasil atuam somente no setor de transporte individual e delivery, sendo 1.274.281 motoristas e 385.742 entregadores. Quase a totalidade é do sexo masculino (97% dos entregadores e 95% dos motoristas). A média de idade é de 33 anos (entregadores) e de 39 anos (motoristas) e a maior parte possui ensino médio completo (cerca de 60% dos motoristas e entregadores).

Segundo o estudo, estima-se que a renda líquida dos motoristas, já considerando os custos, para 40h semanais pode variar entre R$ 2.925 e R$ 4.756 por mês; para entregadores, entre R$ 1.980 e R$ 3.039. Os ganhos observados para as duas categorias são superiores ao salário mínimo e à remuneração média do mercado para pessoas com a mesma escolaridade, dependendo da forma de engajamento do trabalhador com os aplicativos.

Foi mais ou menos o que aconteceu com Silvana Ribeiro, motorista que utiliza a plataforma da 99 em São Paulo para obter ganhos. Ela é motorista parceira da empresa há 5 anos e meio. Formada em administração de empresas, antes de iniciar como motorista de aplicativos Silvana trabalhava com telemarketing em uma distribuidora de medicamentos.

Após um período no trabalho, acabou sendo demitida e, como forma de não ficar sem renda se cadastrou. “Mas o negócio deu super certo e hoje o que eu mais prezo na parceria com a empresa é a possibilidade de autonomia financeira”.

Outro dado da pesquisa mostra como o trabalho na nova economia tem influenciado a busca por flexibilidade e autonomia para decidir quando, o quanto e com quem trabalhar. A pesquisa Cebrap revela 71% dos motoristas que utilizam aplicativos para trabalhar apontam a flexibilidade como uma das principais vantagens. Ainda segundo o estudo, cerca de 60% dos motoristas não estão buscando outra ocupação e querem continuar trabalhando com as plataformas.

É como Jefferson da Silva Gonçalves encara o seu dia a dia. Motorista de aplicativo em São Paulo há cinco anos, ele hoje é “Amigo Anjo” da 99, um grupo de profissionais que orienta novos motoristas que ingressam na plataforma.

“Eu apadrinho uma média de 50 novos motoristas por mês. É muito bom passar a experiência para a frente, ver que posso ajudar outras pessoas a encontrarem uma forma de sobreviver com dignidade, explicar como utilizar as mais de 50 funcionalidades de segurança antes, durante e depois das viagens e ensinar que o respeito é a palavra-chave na relação entre motorista e passageiro. Para isso temos até o Guia da Comunidade”, disse.

No final de 2022, Jefferson, o anjo, conquistou o prêmio de motorista mais bem avaliado do Brasil. De tanto rodar as ruas da cidade, Jefferson acumula dicas que fazem parte de seu dia a dia e compartilha essa experiência com os demais parceiros, inclusive pela internet. “Olha, eu gosto do que faço e de passar para a frente o que aprendi nessa atividade”, afirma. E haja histórias para contar.