Regina Fiore Ribeiro, Repórter São Paulo
 
Você sabe o que é ginecologia natural? Entrevistamos uma especialista no assunto para tirar algumas dúvidas e dar dicas para quem quer começar a entender este trabalho.
 
No Brasil, o acesso à saúde da mulher e às consultas periódicas ao ginecologista ainda é um privilégio. Cerca de 12 milhões de mulheres brasileiras com 16 anos ou mais nunca foram ao ginecologista ou não passam por uma consulta há mais de 4 anos, de acordo com a pesquisa divulgada no começo deste ano pela Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e conduzida pelo instituto Datafolha. Além disso, entre essas mulheres, mais de 20% podem ter problemas reprodutivos e não sabem.
 
Desde o momento da primeira menstruação até a menopausa, o ginecologista é a grande referência da mulher no que diz respeito à medicina e à saúde. As visitas periódicas ao ginecologista é uma prática de 43% das mulheres brasileiras. No entanto, muitas reclamam do atendimento mecânico e sem contato próximo que os médicos mais tradicionais exercem. Até casos de abusos sexuais ocorrem dentro dos consultórios e muitas vezes não são reportados, por medo ou incerteza.
 
O corpo como um todo
 
Nos últimos anos, a prática da ginecologia natural tem sido cada vez mais procurada por pacientes em busca de um atendimento mais humanizado, que seja capaz não só de usar remédios naturais para tratar sintomas, mas também consiga identificar como influências sociais acabam adoecendo o sistema reprodutor feminino.
 
Foi o que nos contou em entrevista a especialista em ginecologia natural Bárbara Schrage, que atende mulheres de todas as idades e busca empoderar suas pacientes e promover o autocuidado, além de ensinar mais sobre a natureza do corpo da mulher: as secreções naturais expelidas durante cada fase do ciclo feminino, a importância da libido e do orgasmo, os cuidados necessários com a vulva e a vagina, a importância dos pelos pubianos para a saúde vaginal, entre outros temas.
 
A ginecologia natural incentiva a mulher a conhecer o próprio corpo, principalmente no que diz respeito ao seu ciclo menstrual. A partir desse entendimento, é possível tratar questões como inflamações, dores durante o sexo, aumento ou diminuição de fluxo menstrual e problemas para engravidar. Na entrevista abaixo, Bárbara Schrage nos conta a relação da ginecologia natural com todo o sistema social e psicológico no qual a mulher está inserida.
 
ENTREVISTA:
 
MULHERES JORNALISTAS: Qual a diferença básica entre a ginecologia natural e holística para a ginecologia tradicional? De onde ela surgiu?
 
BÁRBARA SCHRAGE: A ginecologia natural não é uma especialização da ginecologia tradicional, mas muitas médicas começaram a buscar um caminho mais humano para atender suas pacientes. Esta prática é holística, ou seja, entende a pessoa como um ser complexo e completo, composto de corpo, mente e espírito. Ela sempre existiu. O que está havendo atualmente é um resgate de antigos saberes ancestrais e tradições que há muito foram excluídos pela sociedade. O modelo de saúde atual não contempla mais os indivíduos, a coletividade e a relação com a natureza.
 
MJ: Quais as maiores dúvidas das mulheres que buscam seus tratamentos pela primeira vez em relação à eficácia e ao prazo do tratamento?
 
BS: Muitas mulheres me procuram para buscar alternativas à medicina alopata porque não encontraram nela saída para seus problemas. Meu maior desafio é explicar que as ervas não vão substituir antibióticos e tratamentos mais pontuais, afinal a ginecologia natural é pautada no longo prazo para ser efetiva. O começo é mais complicado, mas a maioria das mulheres que atendo faz todo o tratamento porque se sentem acolhidas e confiam no que ofereço. Algumas conversas iniciais duram até duas horas e as pacientes podem abrir suas histórias, problemas e relações, sem julgamentos.
 
MJ: A ginecologia natural é pautada apenas no uso de ervas e remédios naturais?
 
BS: Não. Existem diversos tipos de terapias disponíveis, que usam diferentes tratamentos. Porém, recomendo muito cuidado em relação às ervas sem conhecimento prévio. Elas precisam ser testadas em cada mulher, porque podem dar reações. O poder sutil das plantas pode ocasionar outros processos no corpo físico. O tratamento com ervas funciona, reduz inflamações e regenera tecidos doentes, mas os padrões sociais podem gerar outras doenças se não forem quebrados. Existem outros caminhos como Yoga, Medicina Ayurvédica e alguns tipos de meditação, de acordo com a busca de cada mulher. Além disso, a alimentação corrida e a ingestão de agrotóxicos e industrializados pioram os casos. Uma dieta saudável é uma grande aliada à cura, muitas mulheres apresentam melhoras muito significativas com uma simples mudança de hábitos alimentares.
 
MJ: Como as questões psicológicas e sociais interferem na ginecologia natural?
 
BS: A mente e os corpos das mulheres estão sobrecarregados, o que acaba somatizando no sistema reprodutor feminino. Colocar-se em segundo plano para cuidar da família faz com que muitas de nós abram mão de sonhos, uma realidade que vem acompanhada de várias doenças, como miomas, cistos ou até endometriose. Alguns resultados de projetos periféricos voltados para a ginecologia natural mostram como comunidades inteiras mudam quando as mulheres conhecem seu aparelho reprodutor. Muitas mulheres estão também a procura do maior autoconhecimento e do despertar espiritual. Uso a aromaterapia, por exemplo, para acalmar e facilitar a comunicação entre nós. Também busco cuidar do espaço e de mim mesma para receber as mulheres de forma saudável.
 
MJ: Na prática, quais outros aprendizados são importantes para a ginecologia natural?
 
BS: Para além das questões comportamentais, aprender e conhecer sobre seu ciclo menstrual, as regras para implantação do DIU e para a realização da laqueadura, conhecer as indicações da Organização Mundial da Saúde para o parto natural e desmistificar o uso do anticoncepcional e dos absorventes higiênicos são os primeiros passos para que as mulheres tomem decisões sobre o próprio corpo. Este movimento de conhecimento ajuda a entender processos e questões mais complicadas, como a dificuldade de engravidar ou manter o bebê. As ervas e chás que eu receito funcionam de forma paliativa, mas a cura vem do entendimento que o sistema reprodutor feminino está diretamente ligado à vivência.
 
MJ: O que você recomenda para quem está buscando mergulhar no assunto e conhecer de perto a ginecologia natural?
 
BS: O mais importante é buscar uma terapeuta capacitada e com referências. Existem muitas pessoas se aventurando nesse campo que indicam tratamentos que não são benéficos. Terapias emocionais inadequadas, por exemplo, podem piorar algumas doenças. Não é porque os tratamentos são naturais ou feitos com ervas e aromas que não têm contraindicações. Além disso, o acompanhamento de um ginecologista alopata é bem-vindo, é possível trabalhar em conjunto.
 
 
Leituras recomendadas:
 
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Caminho para a iniciação feminina
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