Coletivo Mulheres Jornalistas conversa com especialista e doadora para esclarecer as principais dúvidas da população

Por Clara Maria Lino – RJ

A doação de sangue é considerada uma ação solidária em que o doador disponibiliza 450 mililitros dos cinco litros totais de sangue do corpo. O material fica armazenado em um banco de sangue ou hemocentro para uso em transfusões que salvam até quatro vidas. O receptor geralmente se submete à transplantes, quimioterapias, radioterapias, cirurgias, tratamentos hematológicos, dentre outros.
 
Em 2017, o Brasil recolheu mais de três milhões de bolsas e realizou quase três milhões de transfusões. Para o Ministério da Saúde (MS), estima-se que 34% das doações estão ligadas as necessidades de um receptor motivado por família, amigos ou serviço e 66% por doação espontânea.
 
Como já foi colocado anteriormente, o doador pode salvar até quatro vidas. Isso ocorre porque o sangue possui diferentes componentes (hemácias, plaquetas e plasma) que podem beneficiar pacientes com diversos tipos de necessidades. Conforme o MS relata, o sangue é um composto de células que cumprem funções como levar oxigênio a cada parte do corpo, defender o organismo contra infecções e participar na coagulação. Por isso não existe nada que substitua. O volume recolhido não prejudica a saúde e a recuperação é instantânea.
 
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o percentual ideal de doadores no país está entre 3,5% e 5% da população. O Brasil não chega a 2%. Segundo o MS, este gesto faz bem para a própria saúde. Ao doar sangue, o cidadão realiza exames gratuitos feitos momentos antes do ato e pode vir a descobrir problemas e ter a oportunidade de tratá-los ainda no início.
 
A Oficial náutica Karen Rodrigues é doadora de sangue há sete anos. Ela relata que vai ao hemocentro mais próximo de sua casa no Rio de Janeiro, faz a doação que admite ser indolor e se preocupa apenas com pequenos cuidados essenciais pré-doação.
 
” Não sinto dor, acho bem tranquilo, a doação dura cerca de cinco minutos. É só ir lá e doar. É bem simples. Com relação a alimentação eu evito comidas gordurosas, tomo um café da manhã reforçado e ao mesmo tempo balanceado, ou seja, não como gorduras, apenas alimentos considerados leves. Evito ingerir bebidas alcoólicas por aproximadamente dois ou três dias. As vezes eu tenho problemas com relação a taxa de ferro do sangue, minha taxa costuma ser mediana, mas quando acontece isso eu busco comer mais feijão e folhas escuras como couve e espinafre. Depois de duas semanas, um mês, retorno ao local de doação.”
 
Além da doadora Karen Rodrigues, a jornalista que escreve esta reportagem também é doadora de sangue. No final de 2013 eu e minha família descobrimos o diagnóstico de Leucemia por parte do meu pai, André. Sem as bolsas de sangue e sem os dois doadores de medula ele não teria vivido mais quase 3 anos.
 
Durante o tratamento passamos pelo problema de falta de sangue nos estoques por diversas vezes. Meu pai passava dois, três dias esperando uma bolsa para se recuperar e praticar as atividades mais básicas do dia a dia. Sem o sangue, passava seus dias na cama. Após dois transplantes compatíveis de medula e incontáveis bolsas de sangue, nós o perdemos em fevereiro de 2016.
 
A jornalista do coletivo Mulheres Jornalistas entrevistou a médica hematologista Berta Santos do Hospital Universitário Antônio Pedro localizado em Niterói, cidade do Rio de Janeiro. Nesta conversa, Berta esclarece as principais dúvidas da população sobre o tema.
 
1. O procedimento de doação de sangue é seguro? Existe risco de contaminação? Como funciona o processo (etapas)?
Sim, é um procedimento seguro, assistido o tempo todo pela equipe especializada do Serviço de Hemoterapia. O procedimento envolve a avaliação das veias do doador (para escolha do melhor local para punção – caso se perceba que as veias não possuem calibre adequado, a doação é suspensa).
Uma vez selecionada a veia, é realizada a higienização do local da punção que será acessado por material estéril. O sangue começa a ser coletado para o recipiente próprio (uma bolsa contendo solução anticoagulante específica) e ao mesmo tempo, em uma via específica, serão coletados os tubos com as amostras do doador a serem testadas.
Ao final da coleta, a punção é retirada, mantida compressão local e aplicado curativo no local. Caso o doador sinta qualquer desconforto ou sintoma durante a doação, ele será avaliado por profissional Enfermeiro e/ou Médico segundo os protocolos estabelecidos.
 
2. A doação “engrossa” o sangue e entope as veias?
Não.
 
3. A doação faz o sangue “afinar” ou “virar água”?
Causa anemia, não “afina” nem faz “virar água”. Como há coleta de volume de sangue, pode haver uma queda transitória do nível de hemoglobina que é reposta em curto período pelo doador.
 
4. Doar sangue engorda ou emagrece?
Não.
 
5. Mulheres menstruadas podem doar sangue?
Sim, não há impedimento pelo ciclo menstrual em si.
 
6. O doador pode ficar sem sangue suficiente para o organismo?
Não. Na fase de triagem (avaliação), o doador tem seu peso avaliado e é testado quanto aos níveis da hemoglobina. Se não estiver adequado, ele (a) não é aprovado (a) para a doação.
 
7. Quanto tempo demora para o organismo repor os níveis anteriores à doação?
Em torno de 72h.
 
8. Idosos podem doar sangue? Por quê?
Sim. Nossa Legislação permite a doação até os 69 anos de idade, desde que a primeira doação seja feita até os 60 anos.
 
9. Pessoas com piercing e tatuagem podem doar sangue? Por quê?
Podem doar desde que já tenha passado pelo menos 1 ano do procedimento. Como os procedimentos de piercing e tatuagem envolvem manipulação por equipamentos e risco de contaminação por doenças transmissíveis, o prazo seguro (caso ocorra alguma) para que possamos detectar nos testes de triagem é de um ano após a exposição.
 
10. O peso corporal influencia na doação? Por quê?
Sim. O limite é o peso mínimo de 50 kg. A bolsa de coleta tem um volume padrão de solução anticoagulante. E para que essa proporção seja respeitada, o volume coletado não deve exceder 8 ml/kg nas mulheres e 9ml/kg nos homens. Isso é tanto para preservar a segurança do doador quanto para a qualidade do hemocomponente.
 
11. Gestantes e lactantes podem doar sangue? Por quê?
Gestantes não devem doar pois já apresentam pela própria condição algum grau de anemia. As Lactantes podem doar desde que o parto tenha ocorrido há mais de 12 meses.
 
12. Descanso e alimentação influenciam na doação? Por quê?
Sim. Uma boa noite de sono na véspera da doação (pelo menos 6h) assim como alimentação adequada (Não é necessário nem recomendado o jejum) diminuem a ocorrência de reações adversas do doador. Pede-se apenas evitar refeições gordurosas nas 4h que antecedem a doação.
 
13. Gripes e Resfriados podem impedir a doação? Por quê?
Sim. Quaisquer condições que afetem a saúde do doador e sejam risco potencial para os receptores devem ser evitadas. Resfriado sem febre, por exemplo, recomenda-se adiar a doação em 1 semana. Quaisquer outras condições devem ser avaliadas caso a caso.
 
14. Quem já teve qualquer tipo de hepatite pode doar? Por quê?
Não. Quem teve hepatite depois dos 10 anos de idade não pode doar. Antes dessa idade, a doença provavelmente foi a hepatite A, cujo vírus é eliminado por completo do organismo; as contraindicadas são as hepatites B e C, que são transmissíveis pelo sangue mas são testadas nos exames de triagem.
 
Quem pode doar sangue:*
  • Pessoas entre 16 e 69 anos (menores de idade somente com autorização do responsável legal);
  • Pesar mais de 50 kg;
  • Apresentar documento de identidade;
  • Estar saudável;
  • Frequência anual de doação para homens: até quatro doações (2 em 2 meses); Mulheres: até 3 doações (3 em 3 meses).
 
Quem não pode doar sangue em definitivo:*
  • Pessoas que passaram por quadro de hepatite após os 11 anos de idade;
  • Pessoas vivendo com HIV;
  • Pessoas vivendo com doenças associadas ao vírus HTLV I e II;
  • Pessoas com Doença de Chagas e Malária.
Quem não pode doar sangue temporariamente:*
  • Ingestão de bebida alcoólica nas 12 horas que antecedem a doação;
  • Extração dentária: 72 horas;
  • Apendicite, hérnia, amigdalectomia, varizes: 3 meses;
  • Colecistectomia, histerectomia, nefrectomia, redução de fraturas, politraumatismos sem sequelas graves, tireoidectomia, colectomia: 6 meses;
  • Transfusão de sangue: 1 ano;
  • Vacinação: o tempo de impedimento varia de acordo com o tipo de vacina;
  • Exames/procedimentos com utilização de endoscópio nos últimos 6 meses;
  • Ter sido exposto a situações de risco acrescido para infecções sexualmente transmissíveis (aguardar 12 meses após a exposição).
* Além dos pontos já colocados pela médica Berta Santos.