Vinhos coloniais ganham admiradores e fomentam o mercado interno
Por Vivian Jorge, jornalista – RS
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Diretora de jornalismo: Letícia Fagundes, Jornalista
Chefe de reportagem: Juliana Monaco, Jornalista
Editora de conteúdo – Site MJ: Beatriz Azevedo, Jornalista
Entenda as diferenças e peculiaridades dos vinhos finos e vinhos de mesa
Vinho é uma das bebidas mais aclamadas e amadas no mundo. Uns acham a bebida romântica, outros o segredo para longevidade e, os demais, um sabor incomparável. De qualquer maneira, o vinho agrada a todos os paladares e sua história não é nada recente.
Eu já ouvi e li muitas histórias de que o vinho surgiu a 3 mil anos a.c. no Antigo Egito; a 7 mil anos a.c. na Roma antiga; que alguém esqueceu um punhado de uva e ela fermentou dando origem ao vinho; que Noé foi quem inventou o vinho; que Jesus transformou a água em vinho – aí quem sou eu para duvidar -; que uma mulher persa descobriu o vinho etc.
Acredito que várias pessoas em diferentes locais tenham descoberto o vinho, cada uma com um tipo de uva, há época. Contudo, nos tempos atuais, o vinho desembarcou no Brasil por volta do ano de 1500 e foi colonizado pelos italianos, com os famosos vinhos coloniais, feitos de forma artesanal.
Daí nasceu uma paixão mundial que cada vez mais ganha admiradores e vitivinicultores. Segundo o Consevitis (Conselho de Planejamento e Gestão da Aplicação de Recursos Financeiros para Desenvolvimento da Vitivinicultura do Estado do Rio Grande do Sul (Consevitis-RS), o Brasil possui a maior plantação em extensão de videiras americanas e híbridas, o que permite atender à demanda de pequenas e de grandes vinícolas, além de fomentar a agroindústria familiar.
Então, te sugiro servir uma taça com vinho e vir comigo nesse universo cheio de peculiaridades e sabores.
Qual a diferença entre vinhos coloniais, vinhos de mesa e finos?
Primeiro, que o vinho é feito da uva todos sabemos. Segundo, vinho de mesa é feito com uvas comestíveis, uvas de mesa da espécie Vitis Americanas ou Labrusca, como Niágara, Rubi ou Isabel. Terceiro, vinhos finos são feitos com uvas da espécie Vitis Vinífera, uvas europeias como Chardonnay, Malbec e Cabernet Sauvignon, por exemplo.
Somente no primeiro semestre de 2021, os vinhos finos brasileiros ultrapassaram a venda dos 15 milhões de litros, com um aumento de 41% em relação ao mesmo período de 2020, segundo a União Brasileira de Vitivinicultura (UVIBRA).
As uvas finas, geralmente, têm a casca mais grossa, precisam de cuidado no cultivo, tem mais intensidade na cor, diferentes aromas e sabores, bem como sua produção exigem barris de carvalho ou garrafas para manter a qualidade e o envelhecimento.
Já os vinhos coloniais se referem aos vinhos feitos de forma artesanal, em casa. Um vinho colonial pode ser fino? Sim, se o produtor usar uma uva fina na produção. “Os vinhos coloniais são feitos em casa por produtores, no máximo, 20 mil litros. Os produtores que usam uvas de mesa como Niágara e Isabel fazem vinho colonial de mesa. Já os produtores que usam uvas finas como Merlot, Cabernet, produzem vinhos coloniais finos”, explica o proprietário da Vinícola Dom Albert.
Os vinhos coloniais de mesa são feitos para ser consumidos jovens, diferentemente dos finos. Seu aroma mais rústico devido à casca têm um sabor intenso e coloração mais opaca. Já a sua produção varia de produtor para produtor.
As uvas de mesa labrusca são ótimas para sucos e consumo in natura. De acordo, com o Consevitis, os sucos de uvas brancas, rosadas ou tintas, elaborados a partir de cepas americanas e híbridas, têm conquistado cada vez mais espaço no mercado nacional e internacional, representando, em 2020, 79% da produção total no Rio Grande do Sul.
Apaixonado por vinho tinto, Luciano Maidana Freire, de 45 anos, já morou em diversos locais do país, entre eles Amazonas, Rio de Janeiro e a Serra Gaúcha, na qual ficou por quase 20 anos. Hoje, vivendo em Goiás, diz que sua maior saudade do Sul são os vinhos, onde aprendeu a gostar de beber e saborear. “O vinho é uma bebida que me fascina pela condição de poder ser harmonizada com diversos pratos culinários. Para mim, vinho é universal, todos com suas estruturas, aromas e importâncias. Meu preferido é o tinto seco”.
Maidana também conta que foi em Flores da Cunha, no RS, que começou a apreciar os vinhos coloniais produzidos no interior da cidade. “Morando no interior de Goiás, compro vinhos gaúchos quando vou a Brasília ou pela internet. Também passei a apreciar os importados, devido à dificuldade de encontrar bons vinhos aqui. A primeira coisa que olho é o rótulo, a região de produção e o tipo de uva. Os vinhos gaúchos, além de fazerem parte da minha história, são uma das coisas que mais sinto saudades do Sul. Uma pena que aqui não encontro os coloniais”.
Vinhos coloniais versus industrializados
O vinho que você encontra no mercado é industrializado, quando o produtor produz mais de 20 mil litros de uvas cultivadas por ele próprio ou compradas. Os industrializados podem ser de mesa ou finos. Já o colonial, feito de forma artesanal, é o vinho diretamente relacionado a pequenos volumes, feito em casa, ou pequena propriedade familiar, e pode ser de mesa ou fino.
Com certeza, você já viu na prateleira do supermercado um rótulo que diz: vinho tinto de mesa seco. Isso quer dizer que o produtor usou uvas de mesa para uma produção em grande escala, ou seja, vinhos industrializados.
Assim como os finos, os vinhos coloniais também são secos e suaves, o que difere é adição de açúcar que o produtor irá incrementar na sua produção. Na composição do vinho de mesa seco, por exemplo, o açúcar é apenas o da uva utilizada, a partir da sua fermentação. Diferente do suave, que passa por um processo sem qualquer tipo de adição.
Importante ressaltar, ainda, que para comercialização de vinho colonial em larga escala, os produtores devem estar enquadrados na Lei do Vinho Colonial, de nº 12.959/2014, que permite ao produtor registrado as vendas em feiras, cooperativas ou na propriedade utilizando apenas o talão de produtor rural para emissão de notas, sem a necessidade de abrir uma empresa.
Os viticultores gaúchos que têm interesse em regularizar precisam estar enquadrados como agricultores familiares, com comprovação por meio da Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP), produzir até 20 mil litros por ano, com uvas próprias, além de estar incluído no Programa Estadual de Agricultura Familiar (Peaf) do Rio Grande do Sul.
Vinícola Dom Albert
Cláudio Albert Gonçalves Zappe, de 37 anos, iniciou no mundo dos vinhos recentemente e por hobbie. Após algumas tentativas de fazer um vinho com laranjas, ele resolveu fazer o tradicional, de uvas. “Eu nunca havia me interessado por vinhos, até ter essa ideia. Comecei a fabricar e produzir vinhos antes mesmo de gostar dele e com pouco conhecimento. Como eu não tinha uvas, comprei 200kg de uva Niágara Rosa, de um supermercado local, e ficou muito bom. Foi assim que tudo começou, por acidente”, conta.
Niágara é uma uva de mesa, que pode ser consumida in natura ou em sucos e vinhos. “Acho que se eu tivesse conhecimento e cursos na área jamais teria feito vinho desta uva, que, por sinal, ficou muito bom”.
De forma totalmente artesanal, Albert conta que, em 2020, produziu 100 litros, o qual dividiu com amigos e conhecidos, ganhando muitos elogios. “Pessoas que entendiam do assunto me disseram que havia ficado muito bom o vinho, então, para 2021 resolvi investir e nasceu a Vinícola Dom Albert”.
Este ano, o radialista buscou conhecimento, plantou 24 pés de Niágara Rosa em sua propriedade, que fica em Itaara, local serrano no interior do RS, incrementou mais dois tipos de uvas Merlot e Cabernet Sauvignon, uvas finas, e produziu mil litros entre rosé e tinto, todos secos. “É extremamente artesanal. As pipas eu comprei, pois precisa de extrema higiene. Também fiz uma adega subterrânea. Para 2022, quero conseguir uma uva de origem alemã, riesling, uva branca”, avalia Zappe.
Quanto ao solo e ao clima, ele diz que parreirais próximos a grandes massas de água ajudam a regular a temperatura no verão. “Para a uva fazer um bom vinho, ela precisa de sol, mas não calor extremo, então o local onde moro será excelente, pois é um lugar alto, a 470m de altitude, além de ser próximo a uma grande massa de água”, enfatiza.
Hoje, a Dom Albert produz vinhos coloniais finos e de mesa para consumo próprio, amigos e familiares.
Vinho e Saúde
Antigamente, acreditava-se que o vinho tinha relação com a longevidade, que tomar uma taça de vinho todos os dias nos faz chegar aos 100 anos. Será mesmo?
Atualmente, existem muitos estudos que compravam que o vinho traz benefícios em relações com a saúde. Além de melhorar o humor, protege o coração, aumenta a imunidade e previne doenças como um todo, como osteoporose, diabetes, depressão e outras. Isso se consumido de maneira moderada.
Conforme a Uvibra, o consumo moderado do vinho diminui os riscos de doenças coronarianas (infartos), além de prevenir a ação de tromboses, derrames e acidentes vasculares cerebrais isquêmicos. No entanto, ele auxilia no bom colesterol e tem efeito antioxidante.
Adriano Venturini Vinhos Artesanais
Aos 67 anos, o comerciante Luiz Carlos Venturini começou a produzir vinhos para consumo próprio há cinco anos. “Sempre gostei muito de beber vinho. Meu avô, Natal Venturini, e meu pai, Vitório Venturini, produziam vinhos com uvas de parreirais próprias, no interior do RS. Antigamente, amassavam as uvas com os pés. Daí o meu conhecimento e incentivo”.
Luiz conta que resolveu fazer seu próprio vinho colonial pelo fato de que conseguir o vinho puro ficou raro, então, comprou uvas finas de parreirais de Ibarama e Bento Gonçalves. “Hoje, eu compro uva francesa, goeth e lorena. Este ano comprei a uva de mesa Isabel para fazer um rose blend”.
Há dois anos, por incentivo de Luiz, seu sobrinho, Adriano Venturini, de 46 anos, também resolveu iniciar na produção dos vinhos coloniais. “Decidi produzir vinho para ter o privilégio de tomar um vinho puro e de procedência, além da curiosidade nos processos vitivinícolas. Tudo iniciou há dois anos por convite do meu tio Luiz”, conta Adriano.
Com produção de vinhos finos e de mesa, Adriano explica que utiliza as uvas goeth, isabel, merlot e francesa. A goeth, por exemplo, é uma uva híbrida, que vem da moscatel, feita com 87% da vitis vinífera (moscato de alexandria, moscato de hamburgo e schiava grossa) e 13% vitis labrusca (uva de mesa, Isabel) na composição da casta.
Segundo Adriano, toda produção é artesanal, com a remoção dos caules dos cachos das uvas realizado na compra pelo vendedor, com a “desengaçadeira”. A fermentação é acompanhada diariamente com mergulho da casca no mosto (suco que se obtém após espremer a uva). Depois, é passado para os fermentadores deixando no mínimo 120 dias, ou se der tempo, até a primeira geada.
Para o processo do vinho merlot, Adriano diz que a extração dos cachos foi de forma manual, cerca de 140kg de uva. E que este ano produziu 40 litros de vinagre de uva merlot.
A produção da família Venturini é exclusiva para o consumo e presentear familiares e amigos que apreciam a bebida. Além disso, Adriano ressalta que é difícil encontrar informações sobre processos artesanais de vinhos coloniais. “Diferentemente da cerveja artesanal, que encontramos pessoas conversando e ensinando como se faz, o vinho colonial tem essa restrição. É difícil achar e conversar com pessoas que tenham entendimento no processo das vitivinícolas, assim como informações acerca dos termos e nomes. Para ter uma ideia, eu comprava a uva goeth, que era conhecida por outro nome aqui na região: pinô. Levei um ano para descobrir o nome e a origem da uva que eu produzia vinho. Nós, aqui no centro do Estado, estamos fora do local de vinificação, com isso, temos algumas dificuldades”, avalia Adriano Venturini.
E como escolher um vinho colonial? Luiz diz que um vinho bom quando é encorpado, quando sentimos o sabor e o cheiro da fruta. Adriano indica pelas sensações e aromas que os vinhos trazem ao paladar.
E você, gosta de vinhos? Aprecia vinhos coloniais ou se arrisca a produzir um?