No Brasil, o número se crianças diagnosticadas com Síndrome Inflamatória
Multissistêmica Pediátrica (SIM-P) tem preocupado muitos pais

Por Daniele Haller
daniele.haller@mulheresjornalistas.com

Apesar de crianças e jovens terem sido classificados como não pertencentes ao grupo de risco da Covid-19, a manifestação de uma síndrome associada ao vírus, dentro deste grupo, coloca os profissionais de saúde mais uma vez em alerta. No ano passado, o Brasil registrou 577 casos da síndrome, segundo o boletim epidemiológico do Ministério da Saúde. No exterior, os hospitais do Reino Unido chegam a receber até 100 crianças por semana, de acordo com o jornal The Guardian.

Segundo o Ministério da Saúde, a maioria dos casos confirmados no Brasil apresentaram exames laboratoriais indicando infecção atual ou recente pelo SARS-CoV. Dos 577 casos SIM-P confirmados até 5 de dezembro de 2020, 78,9% foram de crianças e jovens que testaram positivo para a Covid-19, a outra parte(21,1%) teve apenas histórico de contato com pessoas infectadas. Do número total de casos, 39 foram a óbito, de acordo com as informações publicadas no último boletim epidemiológico do Ministério da saúde, divulgado no dia 5 de dezembro de 2020.

Os estados com maior concentração de casos, segundo o boletim; São Paulo, Pará e Ceará, seguidos do Rio de Janeiro. Em janeiro desse ano, uma criança de 7 anos faleceu em decorrência da SIM-P no estado do Rio Grande do Sul, a única morte registrada em 2021, até o momento.

Joana D'arc, mulheres jornalistas, instituto mulheres jornalistas,
Dra. Joana D’arc

As notícias sobre os números de internações de crianças no Reino Unido têm levantado discussões no Brasil, em especial pela recente reabertura das escolas. Muitos pais temem que o retorno das aulas possa piorar a situação diante da pandemia. Para saber mais a respeito da SIM-P, a repórter Daniele Haller, do Instituto Mulheres Jornalistas, entrevistou a infectologista Dra. Joana D’arc Gonçalves.

MJ: Desde o ano passado, foram detectados inúmeros casos de Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica (SIM-P) no exterior e ,atualmente, também no Brasil. O que é essa síndrome e quais os sintomas?

Dra. Joana D’arc: Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica (SIM-P), representa um conjunto de manifestações clínicas “excepcionalmente raras”, acredita-se que representam apenas 1-2% de todos os casos de infecção por coronavírus. Médicos a descreveram como um “novo fenômeno” semelhante à síndrome do choque da doença de Kawasaki- uma condição rara que afeta principalmente crianças menores de cinco anos e os sintomas incluem erupção na pele, glândulas inchadas no pescoço e lábios secos e rachados, entre outros. Na SIMP Os sintomas são variados e incluíam erupção cutânea (80%), conjuntivite (60%), alterações na mucosa oral (57%), eritema (51%), edema (40%), hiperemia labial (49%) ou gretas (37%) e língua de morango (23%). Esses sintomas ocorreram em média 2,7 dias após o início da febre, e a presença ou ausência desses sintomas não foi associada à gravidade da doença. Pode evoluir para sintomas de maior gravidade que vão desde alterações cardiovasculares (miocardite, pericardite, arterite), dano renal, problemas gastrointestinais e hematológicos (anemia, diminuição de plaquetas, coagulação aumentada, entre outros), pode levar ao óbito. A SIMP também afeta crianças mais velhas de até 16 anos, com uma minoria passando por complicações graves.

MJ: A SIM-P está sendo está ligada à Covid 19, uma vez que as crianças que apresentaram o problema também haviam sido infectadas com o vírus. Existe uma explicação a respeito dessa conexão entre as doenças ou são apenas suspeitas?

Dra. Joana D’arc: Essa semana, no The Guardian – jornal do Reino Unido publicou que : Quando o SIMP surgiu na primeira onda da pandemia, causou confusão entre os médicos, preocupação e alarme entre os pais. Inicialmente, pensou-se ser a doença de Kawasaki, uma condição rara que afeta principalmente bebês e crianças pequenas. Mas a SIMP foi reconhecida como uma nova síndrome pós viral separada que afeta uma em cada 5.000 crianças até cerca de um mês após ter tido Covid, independentemente de apresentarem sintomas.

MJ: A síndrome SIM-P tem potencial de contágio assim como a Covid-19?

Dra.Joana D’arc: A SIMP está associada a fatores genéticos e socioeconômicos, não sabemos quem irá desenvolvê-la, não é transmissível. Como a doença pode ocorrer dias, semanas após a infecção aguda, inclusive podem ser afetadas até seis semanas depois de terem sido infectadas com o coronavírus, a criança é transmissora do vírus SARS-COC-2 durante as primeiras semanas da infecção, depois o organismo sofre as consequências da infecção por alterações imunológicas. A biologia da doença, de alguma forma, envolve uma resposta imune incomum ao vírus, devido a fatores genéticos. Isso significa que é provável que seja algo relacionado ao acúmulo de anticorpos após a infecção.

*Durante a entrevista, Dra. Joana reforçou a informação de que o contágio acontece em decorrência da Covid-19, e não da Síndrome. A SIM-P não é transmissível.

MJ: Quais os riscos que a SIM-P pode trazer ao paciente? Existe a possibilidade de casos graves?

Dra. Joana D’arc: A SIMP pode ser grave e inclusive letal. Sabemos que pode ocorrer
um processo inflamatório intenso com acometimento de órgãos como coração, rim, cérebro, entre outros. Como o nome indica, multissistêmica e perigosa. Mas para nossa sorte é muito rara.

MJ: Existe um grupo que esteja mais vulnerável a ser acometido pela síndrome?

Dra. Joana D’arc: Atualmente houve um aumento do número de casos no mundo. No Reino Unido, por exemplo, há atendimento de até 100 crianças por semana, casos que em abril de 2020, eram 30 por semana.

MJ: No Brasil, já foram registrados casos da síndrome em diversos estados, com o óbito de uma criança de 7 anos, no Rio Grande do Sul. Mais uma razão para muitos pais se preocuparem?

Dra. Joana D’arc: Devemos ser vigilantes e reconhecer os primeiros sinais da doença e nos serviços de saúde mais treinamento para estarmos aptos para diagnosticar e tratar rapidamente.

MJ: Quais os primeiros cuidados que os pais devem ter com o surgimento dos primeiros sintomas?

Dra. Joana D’arc: Ao notar que seu filho apresenta alguns sintomas diferentes como manchas vermelhas no corpo, conjuntivite, rachaduras nos lábios, febre e antecedente de COVID 19 na família, procure os serviços de saúde. Lembrando que a SIMP pode aparecer até seis semanas após a infecção por SARS-COV-2.

MJ: O tratamento da SIM-P pode ser acompanhado e realizado pelos pais/responsáveis em casa ou apenas através da internação hospitalar?

Dra. Joana D’arc: Geralmente a família vai precisar de orientações muito importantes.
Nos casos de maior gravidade a criança deve ficar hospitalizada para tratamento com medicações que diminuam o estado de inflamação produzido pela doença, somente após estabilidade clínica que o tratamento deve ser mantido no domicílio seguindo as recomendações propostas caso a caso.

MJ: Existe o risco de sequelas?

Dra. Joana D’arc: Sim, depende do nível de acometimento dos órgãos. Pode haver lesão renal, cardíaca e dependendo do nível de acometimento do tecido, podemos observar diversas consequências, sequelas, como as observadas na COVID de forma geral, desde insuficiência renal, alterações neurológicas, entre outras.