Por Giselle Cunha, Jornalista – RJ
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Diretora de jornalismo: Letícia Fagundes, Jornalista
Chefe de reportagem: Juliana Monaco, Jornalista 
Editora de conteúdo – Site MJ: Beatriz Azevedo, Jornalista

A manutenção do peso é tão importante para o animal quanto para nós, humanos

A obesidade é uma doença que, nas últimas décadas, tem alcançado grandes proporções a nível mundial. O ritmo de vida acelerado, o crescimento das redes de fast food e o contato excessivo com a tecnologia levaram grande parte da população a abandonar hábitos saudáveis que antes faziam parte do nosso dia a dia, como cozinhar em casa, descascar mais e desembalar menos, praticar atividades ao ar livre e manter uma rotina regular de sono.

Resultados da Pesquisa Nacional de Saúde, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no ano de 2019, mostra que, entre os anos de 2003 e 2019, o número de obesos no Brasil acima dos 20 anos dobrou.

Dizem por aí que o animal é o espelho do dono, e talvez essa frase faça algum sentido.  Uma rede de hospital veterinário norte americana, chamada Banfield Pet Hospital, realizou uma pesquisa através dos registros de saúde de milhões de animais atendidos pela rede e foi constatado que, nos últimos 10 anos, o aumento de cães diagnosticados com sobrepeso e obesidade foi de 108%, enquanto os gatos apresentaram um aumento de 114%.

Emoção X Comida

Quem nunca recebeu aquele clássico olhar do “Gato de botas”, não sabe o quanto é difícil segurar a emoção de compartilhar aquele pedaço de pizza, aquele pão ou mesmo aquele biscoito com o seu amigo peludo.

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Foto: Reprodução/Freepik

O grande desafio nessa corrida da alimentação saudável é aprender a distinguir quando se trata de uma fome física e quando se trata de uma fome emocional. Se para nós mesmos torna-se difícil lidar com essa questão, imagine ter que separar esses aspectos para o seu animal também?

Muitos tutores costumam ceder a essas chantagens emocionais dos peludos, pois acreditam que, os agradando, vão conseguir seu afeto mais rápido ou simplesmente por não verem mal algum em dividir um pequeno pedaço do que comem. É importante esclarecer que o sistema digestivo do animal funciona diferente do ser humano e muitos apresentam intolerância à lactose. Não vale a pena testar e depois ter que arcar com custos veterinários. A melhor estratégia é colecionar com o seu melhor amigo momentos de diversão e muito carinho. Falamos sobre o comportamento e os sentimentos dos animais nas reportagens Adoções que Retornam e Voltei, e agora?.

É hora de se movimentar

As casas deram lugar aos edifícios que, por sua vez, possuem apartamentos com metragens menores ano após ano. Claro que isso também influencia no estilo de vida de todos, inclusive dos animais que perderam o espaço para cavar, correr e, consequentemente, se manter ativo por mais tempo.

Por isso, a importância de deixarmos a preguiça de lado e separarmos uns minutos diários para se dedicar à essa atividade. Separamos alguns exemplos de exercícios, desde os mais simples até os mais complexos, para você escolher qual se enquadra melhor. Lembre-se sempre de consultar um médico veterinário especializado e estabelecimentos credenciados para garantir a segurança e o bem-estar do seu pet.

  • Passeios de coleira

Não a subestime, apesar de parecer uma atividade bem simples, ela é muito eficaz para o emagrecimento, proporciona ao animal a socialização, não tem restrições, pois cães de qualquer idade, raça e até mesmo os que possuem dificuldade de locomoção podem fazê-la, e ajuda a estimular todos os sentidos como o olfato,a audição, visão e o tato.

Sempre crie um cronograma respeitando os melhores horários e temperaturas para evitar acidentes com os peludos. Falamos sobre os melhores horários na reportagem Minha pata, meu corpo.

  • Brincadeiras para fazer dentro e fora de casa

Você pode brincar com o seu animalzinho de jogar a bola, esconde-esconde, pique e pega ou ainda usar como recurso aquelas bolas que possuem um espaço no meio para rechear com petiscos e fazê-lo procurar.

  • Creches

Com o crescimento do mercado pet, muitos empreendedores investiram em terrenos amplos, com bastante gramado, piscina e brinquedos para garantir hospedagens ou mesmo ou Day use do espaço. Pesquise, busque referências e experimente.

  • Natação

Isso mesmo, nadar também faz muito bem para o emagrecimento dos animais, além de ser uma atividade de baixo impacto. Então pets com problemas de articulação, por exemplo, podem realizar sem problemas.

  • Canicross

Se você gosta de correr, por que não levar o seu melhor amigo? Essa atividade os uni através de uma guia elástica que fica presa à cintura do proprietário. Lembramos que essa atividade já entra em uma categoria mais intensa, portanto consulte o médico veterinário antes de realizá-la.

  • Agility

Essa prática envolve muito foco, atenção e um alto grau de envolvimento entre o animal e o seu tutor. Conhecida por haver campeonatos e premiações, a agility exige muito treino e dedicação, porém não tem restrição quanto à participação porque todo o circuito e a intensidade é pré estabelecida pelo tutor.

Agora, se ainda assim você acha que não consegue cumprir nenhuma das opções acima, lhe digo que existe outra possibilidade.

Você já ouviu falar na profissão Dog Walker?

Ela surgiu nos Estados Unidos na década de 1960 e o primeiro profissional reconhecido foi Jim Buck. Em regra, trata-se de um profissional treinado para lidar com comportamento animal e que consegue desenvolver o passeio com vários ao mesmo tempo, sem ter problema.

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Foto: Reprodução/Freepik

Aqui no Brasil, a profissão ganhou visibilidade após a personagem Edwiges, interpretada pela atriz Carolina Dieckmann na novela Mulheres Apaixonadas em 2003, exercer a função. Com o passar dos anos, a especialização para exercer a profissão já não se faz necessário, porém nunca se esqueça que, ao entregar o seu animal para terceiros, sempre existe um risco de haver acidentes. Portanto, pesquise referências antes de contratar esse tipo de serviço.

Existem sites especializados que oferecem esse serviço e que declaram haver um rígido controle de inscrição e treinamento antes que o profissional esteja efetivamente habilitado para desempenhar a função. Também servem como uma boa opção quando não houver alguém mais próximo.

Assim como para nós, humanos, controlar o peso e manter um estilo de vida saudável para os animais nada tem a ver com estética e sim com a qualidade de vida. Estima-se que animais obesos ficam 20% abaixo da expectativa de vida normal da espécie. São pequenas mudanças, pequenos novos hábitos que podem prolongar com qualidade a vida do seu melhor amigo.

Para conversarmos sobre esse assunto tão importante, o Instituto Mulheres Jornalistas convidou o Dr. Felipe Gazza Romão, médico veterinário especializado em endocrinologia com mestrado e doutorado pela FMVZ UNESP Botucatu e sócio proprietário da empresa Endocardiovet, especializada em endocrinologia e cardiologia veterinária.

Mulheres Jornalistas (MJ): O que pode causar a obesidade em animais?

Dr Felipe: A obesidade pode ser causada por uma doença de base, principalmente por endocrinopatias (especialmente o hipotireoidismo e o hiperadrenocorticismo), ou por erro de manejo do tutor, que é o mais comum de ocorrer devido ao excesso de petiscos, alimentos com carboidratos simples. Muitos tutores não vêem problema em oferecer uma bolacha ou um pão para um pinscher de 2kg, porém, para um cão nessas condições, conseguir perder peso vai precisar em média de 150 ou 200 por dia. Ao oferecer esse tipo de alimento, a cota calórica do dia já fica comprometida e com componentes de baixa qualidade.

MJ: Como podemos identificar se o animal está obeso?

Dr Felipe: Atualmente, existem várias formas, porém a mais fácil é pelo score de condição corporal. Um animal numa boa condição, considerado nota 5 em uma escala de 1 a 9, tem as costelas facilmente palpáveis, porém não visíveis. Tem uma cintura em formato de ampulheta e não tem acúmulo de gordura ao redor da cauda. Conforme o score vai subindo para sobrepeso, obesidade ou obesidade mórbida, vão surgindo outras alterações como acúmulo de gordura na região do tórax, na região abdominal e nos outros pontos citados.

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Entrevistado Dr Felipe Gazza Romão, veterinário endocrinologista. Foto: Acervo Pessoal/Felipe Romão

MJ: Como prevenir esta doença?

Dr Felipe: A prevenção está relacionada aos hábitos alimentares e à prática de exercícios. É importante citar um tabu existente com relação à castração. Quando o animal é castrado, há uma diminuição de cerca de 25% a 30% da sua necessidade energética, ou seja, se antes ele comia 100g por dia para manter o seu peso, após o procedimento ele passará a comer 75% ou 70% daquela quantidade para que não ocorra o aumento do peso. Isso porque ocorre uma queda de alguns hormônios responsáveis por manter o nível de atividade do metabolismo. Não é a castração em si que gera a obesidade, e sim o manuseio errado na quantidade do alimento. Oferecer alimentos de boa qualidade como os considerados super premium, que possuem proteínas de boa qualidade, carboidratos complexos, também auxilia nesse processo de prevenção.

MJ: Quais consequências o animal obeso pode sofrer?

Dr Felipe: O animal obeso pode sofrer consequências osteoarticulares, cardiovasculares, embora existam alguns trabalhos que mostram, no caso de animais de pequeno porte, que a hipertensão não esteja tão ligada com a obesidade conforme ocorre com os humanos e, por fim, problemas hepáticos.  Essas são as principais, mas existem outras também.

MJ: Para a manutenção da alimentação com rações, o senhor considera mais eficaz as rações lights ou as que possuem em sua fórmula elementos que geram maior saciedade ao animal?

Dr Felipe: São duas coisas que caminham juntas. As rações light são rações leves, ou seja, têm menos calorias porque tem menos gordura, porém acabam carregando mais nos carboidratos e isso também não é bom para um paciente obeso. Esse tipo de paciente tem uma necessidade energética mais voltada para maiores níveis de proteína, maiores níveis de fibra, justamente para trabalhar a saciedade, e menores níveis de gordura e carboidrato. Sempre utilizando carboidratos complexos, aqueles que tem uma absorção mais lenta. Essas dietas também podem ser suplementadas com L Carnitina, que é um aminoácido que aumenta a concentração de carne magra, faz a conversão de tecido gordo por tecido magro.

Existem algumas substâncias que estão em fase de estudo, mas ainda não são utilizadas devido ao preço elevado. Costumamos usar bastante o óleo Ômega 3, que possui efeito antioxidante e antinflamatório, a própria L Carnitina, conforme expliquei acima e uma dieta de boa qualidade