Por Mariana Mendes, Jornalista –SP
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A atividade é reconhecida internacionalmente como esporte e cresce cada vez mais

“O pole é um divisor de águas na minha vida. Significa eu transmitir o melhor de mim e conseguir extrair o melhor das pessoas. Eu me sinto um agente transformador de vidas”. Essa é apenas uma das falas de Cristina Manah, de 35 anos, servidora pública e professora de pole dance ao falar sobre o esporte. Sim, o pole dance é um esporte. Reconhecido pela Global Association of International Sports Federation em 2017, a atividade vem ganhando o público brasileiro e do todo o mundo por toda sua complexidade, benefícios para a saúde física e mental.

Com esse reconhecimento, muitos atletas e praticantes sonham com, um dia, tornar o pole dance um esporte olímpico. Há competições profissionais em diversos países, mas esse novo status de esporte foi conquistado através de uma grande campanha da inglesa Katie Coates, que fundou a Federação Internacional de Pole Sports (IPSF). Com isso, existe um peso maior para a instituição ser reconhecida pelo COI (Comite Olímpico Internacional).

Para entrar nos Jogos Olímpicos, é preciso que o esporte se encaixe na Carta Olímpica e atenda aos seguintes critérios: ser amplamente praticado por homens em pelo menos 75 países e em quatro continentes e por mulheres em nada menos que 40 países e em três continentes. Ou seja, ainda há um bom caminho para o pole dance, que tem cerca de 20 federações nacionais no momento, já é parte da Wada (Agência Mundial de Antidoping) e está trabalhando para se tornar membro da Gaisf. Juliana Muniz, de 37 anos, empresária e professora de pole dance, fala sobre o impacto da decisão da Gaisf: “Ainda não temos essa dimensão. Devido à pandemia, infelizmente, não conseguimos realizar eventos e divulgar todas as informações necessárias.”

A IPSF diz que o esporte é “um dos que mais crescem no planeta”. Segundo a instituição, o pole dance é voltado para “o atletismo e para méritos técnicos”, assim como “outros esportes olímpicos como ginástica olímpica, salto ornamental e patinação no gelo”. Por isso, as atenções deveriam se voltar para o pole. Entretanto, é possível traçar uma linha de dificuldade para o pole dance um dia ser amplamente conhecido como esporte através de certo preconceito, por ser associado com casas de shows, strip-tease e conter elementos eróticos.

Porém, esse conceito do pole dance ser apenas uma dança sedutora está sendo cada vez mais quebrado e, quanto mais espaço ganha na vida das pessoas, mais reconhecimento como esporte ele recebe. Cristina Manah explica que o pole dance é uma prática esportiva – e não apenas uma dança – devido sua característica gradativa e acrobática. “O corpo precisa ter uma preparação, um condicionamento. Gradativamente, a gente vai estimulando os grupos musculares, várias áreas do corpo. É uma ginástica tendo como principal instrumento uma barra vertical.”, explica.

O pole dance não é considerado no Brasil um esporte. Apesar de já existirem discussões da prática se tornar um esporte olímpico com a adesão mundial crescente, o Superior Tribunal Federal reconhece o pole apenas como dança. Cristina ressalta que é preciso um grande treinamento para realizar as acrobacias, por isso, na prática, deveria ser um esporte. A decisão legal da justiça brasileira impede o crescimento da atividade e o investimento para formação de atletas.

Sobre a decisão da justiça brasileira, Muniz comenta que “além da falta de interesse e apoio do governo, fica a falta de informação. O pole, se estudado a fundo, será comprovado que tem todos os benefícios que qualquer outro esporte possui. Eu acho mesmo que precisamos de mais visibilidade.” Existe uma instituição que busca esse reconhecimento, a Confederação Brasileira de Aéreos e Pole Dance, fundada em 2019, sem fins lucrativos e nenhuma associação ao Comitê Olímpico Brasileiro e ainda não reconhecida pela Federação Internacional de Pole Sports.

Entretanto, enquanto esse reconhecimento da jurisprudência brasileira não acontece, Kelli Muller de Souza, educadora física e professora de pole, ressalta a complexidade do esporte. “O pole, inicialmente, é um esporte. Não tem como fugir disso. Você está executando força. Você precisa ganhar força para executar um movimento. Por isso, você tem que ter força de abdômen,  força de braço. Você tem que executar flexão. Então, é uma atividade física”, diz.

Edi Reis fez história ao se tornar campeã mundial de Pole Sports em 2019, na competição internacional disputada no Canadá. Aos 55 anos, a atleta possui no currículo, além do campeonato mundial, oito campeonatos brasileiros da modalidade. Ela começou a praticar o esporte para emagrecer e, hoje, se tornou uma das referências do pole.

Ela já conquistou 18 medalhas entre competições nacionais, internacionais e mundiais; e é a segunda colocada no ranking global do esporte. “Eu buscava algum tipo de exercício que me ajudasse a perder peso, mas para minha idade, não tinha nada. Vi o Pole em uma novela, me interessei e fui atrás”, contou após a vitória em 2019.

Os benefícios do Pole Dance

Atividade física, seja ela qual for, é sempre importante para a saúde. Porém, a prática do pole envolve diversos mecanismos corporais que ajudam no condicionamento dos alunos e atletas. Cristina Manah encontrou o esporte após um grave acidente e ele transformou sua vida.

“Comecei a praticar pole para me ajudar na recuperação da coordenação motora prejudicada em razão das sequelas de um acidente que eu sofri no ano de 2016”, conta. Mesmo com os tratamentos de fisioterapia, Cristina sempre via seus movimentos limitados. Anos antes, ela foi professora de dança do ventre, mas sempre quis experimentar o pole dance. Após o acidente, ela foi atrás para finalmente praticar.

“E como aluna já amei, me apaixonei, foi um divisor de águas na minha vida. Não só melhorou minha coordenação motora, como melhorou o equilíbrio, a força, o senso de direção e os reflexos pra situações de perigo. Tudo isso o pole estimula muito”, expressa.

“Você não tem [força]? Não importa. Você vai adquirir força porque o pole é uma atividade gradativa. Melhora a sua flexibilidade, você fica mais ágil e treina muito a sua concentração e atenção. Ainda falando sobre os benefícios físicos, auxilia no emagrecimento, na tonificação muscular e na circulação sanguínea”, complementa Cristina.

Juliana Muniz explica o funcionamento da prática do pole para o organismo. “Vamos dar um exemplo de uma pessoa que teve um dia exaustivo e mentalmente cansativo. O esporte libera um hormônio chamado endorfina e ele faz com que o cérebro relaxe. Isso faz com que o indivíduo consiga desconectar e relaxar mentalmente, além de socializar, o que já é comprovadamente um benefício.”

Kelli Muller, educadora física e professora de pole, comenta que muitos de seus alunos buscam o esporte após se cansarem da academia. “Ele trabalha toda força muscular, então, a pessoa que está enjoada de fazer academia vem pro pole. Quem precisa de um fortalecimento e não quer mais fazer os mesmos exercícios”.

“Você pode trabalhar toda a sua parte de força muscular de braço, abdômen, perna, trabalha a parte de flexibilidade, pois, quanto mais alongada, mais bonito ficam os movimentos. O condicionamento físico junta também com a dança. O movimento fica aeróbico e até o pole sensual, que é de salto alto e mais coreografado, pega muito a parte de condicionamento físico. Em relação à saúde mental, é impressionante como as pessoas mudam depois que começam a fazer pole. Normalmente, a pessoa vem de cabeça baixa, tem vergonha, tem algum problema de depressão e o pole trabalha muito a questão da autoestima”, conclui Kelli.

Superando os preconceitos

Muito da dificuldade de popularizar o esporte vem do preconceito e noção estereotipada de que o pole dance é uma dança erótica. Em 2016, o assunto gerou polêmica com uma hashtag de mulheres que praticam a atividade, compartilhando fotos com a hashtag #notastripper (“não sou uma stripper). “Existe sim essa visão ultrapassada. Ela é mais de pessoas leigas que associam pole somente a algo erótico ou como algo para mulher fazer para satisfazer desejo ou fetiche de alguém, como se sempre para dançar pra outra pessoa”, comenta Cristina.

E com essa visão ultrapassada, criam-se julgamentos para os praticantes. “Recebi julgamentos de vários tipos, uns diretos, outros não, do tipo ‘vai montar um cabaré’, ‘quero que você dance pra mim’. E ser associada com essas coisas, as pessoas colocam em jogo seus valores. Já fiquei constrangida em alguns lugares quando perguntam minha profissão. No início, eu me senti constrangida em razão de pré-julgamentos de estar num ambiente mais machista”, conta Cristina.

“Infelizmente, o primeiro pole que o homem vê é numa boate de striptease. Depois nos filmes que tem a mulher arrancando a roupa e dançando na barra. Então, a maioria das pessoas – não só os homens -, infelizmente têm essa visão do passado. Quando a gente faz apresentações ou espetáculos de pole, a pessoa entra com uma visão e sai de lá apaixonada pelo pole”, também fala Kelli.

Kelli diz que já teve casos de alunas que os pais não queriam assistir uma apresentação, pois estavam com medo do que eles iriam ver a filha fazendo.

“Ele não queria entrar e aí com muito custo ele entrou, assistiu e saiu de lá quase chorando, apaixonado e falou que é artístico. Disse: ‘você faz muita força, é lindo’. Então, a pessoa sai realmente com outra visão”, Kelli relembra um caso específico.

A modalidade ganha muito as mulheres pela possibilidade de empoderamento tanto físico quanto emocional. As professoras explicam que muitas das suas alunas buscam o pole dance para melhorar a autoestima, pois é um esporte que tem a capacidade de evocar a sensualidade. Porém, as pessoas que praticam estão cada vez mais mudando.

“Eu tenho uma aluna hoje de 65 anos”, conta Cristina. “Ela está praticando e é uma opção de esporte e entretenimento pra ela. Ela não vai fazer necessariamente para o marido”. Além disso, ela relata o aumento da procura de pais que querem matricular seus filhos nas aulas de pole dance. Para entender como a prática está caminhando cada vez mais para o estado de esporte no Brasil, é só ver o crescente número de crianças fazendo a atividade, conhecida como pole kids.

Além disso, Kelli comenta sobre os homens que também buscam o esporte. “Eles têm muita facilidade no quesito força. Alguns pecam na questão da flexibilidade. Tem alguns que já vêm do balé, então já são superflexíveis, já arrasam em tudo. Mas eu acho maravilhoso ter homens executando o pole. É lindo de ver, né?”, diz.

“O pole é um esporte que a mulher faz para ela mesma, para ela se ver linda, para ela se superar, se sentir mais maravilhosa. Fazer para seduzir o outro? Pode. Mas isso é um é um bônus, tá? É uma consequência de como essa mulher se sente primeiro com ela, daquilo que ela faz primeiro para ela”, completa Cristina.

Juliana dá dicas para aqueles que querem acompanhar e apoiar o esporte. “Temos inúmeros campeonatos durante o ano. O ano de 2020 foi marcado pela pandemia, então não tivemos quase nenhum campeonato presencial, somente online. Porém, em 19 de dezembro, terá o Interpole ABCD. Será um campeonato que terá como tema “Valentes. Mulheres que mudam o mundo”. Vamos homenagear as mulheres que fizeram e ainda fazem de tudo para que possamos continuar conquistando nosso lugar de direito. Neste evento, vamos arrecadar material de higiene pessoal para doar para mulheres em situação de rua. Grandes nomes do Pole Dance nacional estarão presentes. Esse evento será incrível”, ressalta.