Por: Ana Luiza Timm Soares
Diretora de jornalismo: Letícia Fagundes, Jornalista
Chefe de reportagem: Juliana Monaco, Jornalista

A polêmica em torno de Kim Kardashian e o vestido de Marilyn Monroe ganha um novo capítulo. Na última semana, fotos de “antes e depois” do uso no Met Gala – mesmo que por 15 minutos, já que o original apenas atravessou o tapete vermelho e foi substituído por uma réplica em seguida – mostram as costas da peça danificada, faltando cristais e esgarçada próximo ao zíper. 

Nem vou entrar no mérito da dieta ultra restritiva que fez Kim entrar no vestido, muito menos demonizar a celebridade, já que a preservação da peça dependia do museu que NUNCA, JAMAIS deveria ter o deixado sair do local onde estava exposto.

O que eu quero falar aqui é sobre o menosprezo pelo artefato: nos sites em que divulgaram a notícia, uma avalanche de comentários do tipo “é só um vestido”, “vocês não têm temas mais importantes para tratar”, “tanta gente passando fome e vocês aí preocupados com uma peça de roupa”, e por aí vai. Pois bem, meus caros. Estou aqui para bradar: NÃO, NÃO É SÓ UM VESTIDO! 

Vejamos um exemplo. Se alguma celebridade solicitasse o “uso” de um Picasso por apenas 15 minutos em sua casa, para tirar uma foto e aparecer nas páginas da revista Caras mostrando a mansão de milhões onde vive (e do que se alimenta :P), o que vocês diriam? É só um quadro? Ou pensariam que aquela obra não deveria ser exposta à luz, poeira, vento e demais intempéries? E o museu em que estaria esse quadro? Será que teria a mesma permissividade com tal artefato histórico? – Ah, tá bem, leva. Mas cuida, tá? OI? Tão de sacanagem, né? 

Ora, se tanto a pintura quanto o vestido fazem parte da cultura material produzida pela humanidade e ambas giram em torno do mesmo período, por que uma delas “é só” e a outra “é um”? Essa desvalorização da roupa enquanto artefato cultural historicamente validado é um reflexo da forma como tratamos o vestuário. Descartável. Fútil. 

O famoso – e polêmico, desde sua concepção em 1962 – vestido de Marilyn foi assinado pelo designer vencedor do Oscar Jean-Louis e precisou ser costurado, para finalizar, já no corpo da atriz. Com mais de 2.500 cristais, o processo foi tão complicado que contribuiu para o atraso de mais de duas horas da atriz para cantar seu famoso “Parabéns, para você” para JFK. Uma verdadeira obra de arte. Então não, não é só um vestido. É o corpo que o vestiu, o lugar e momento histórico em que foi usado. Ele é as aventuras de quem o estava abrigando. Carrega suas memórias. 

Veja, sou super a favor do reuso de peças, muitas atrizes apostam no vintage como uma forma sustentável de consumo e posicionamento, o que é bárbaro. Mas o vestido em questão estava resguardado de qualquer contato com externo há décadas. Obviamente seu valor financeiro deve ter ido às alturas depois de toda a polêmica. E também seu valor simbólico, já que duas celebridades fizeram uso do mesmo. 

Mas eu pergunto: valeu a pena? Vou ali dar uma rasgadinha na tela de “Les Femmes d’Alger (Versão O)” e a gente volta a conversar, ok?