A população feminina no campo é responsável pelo autoconsumo de alimentos no meio rural. Ainda assim, existem poucas políticas públicas que contemplem suas necessidades
 
Por Regina Fiore- Repórter Rio de Janeiro

As mulheres que fazem parte da população urbana passaram a trabalhar no mercado formal mais tarde do que as mulheres que formam a população urbana, isso porque a mão de obra necessária para a agricultura, principalmente, vem tanto de homens quanto de mulheres. Além disso, a realidade do campo incluí outras peculiaridades, como baixa escolarização, precariedade em métodos contraceptivos e pouco acesso à infra-estrutura, saneamento básico e saúde. 
 
Se comparadas à mulheres que vivem nas cidades, a população feminina rural tem expectativa de vida mais baixa, começam a realizar atividades em lavouras e plantações mais cedo, se casam e têm filhos mais cedo. Isso porque o acesso à informação no campo é muito menor do que nas cidades, além de todo um processo de esquecimento dos agricultores. 
 
No entanto, mais de 20% dos empreendimentos rurais já são comandados por mulheres, apesar de apenas 3% delas terem estudado mais de 15 anos, ou seja, completado o segundo grau da escolarização. São pescadoras, agricultoras, extrativistas, artesãs, indígenas e quilombolas que buscam ocupar seu espaço dentro de um país que desvaloriza não só a cultura rural e sertaneja, como também a mulher que tira seu sustento do campo. 
 
Nos últimos anos, no entanto, principalmente durante os anos 2000 e 2010, as trabalhadoras rurais têm se destacado em diferentes etapas do processo produtivo das atividades econômicas ligadas ao campo. O perfil dessas mulheres, em relação à etnia, é predominantemente pardo (56%), de acordo com a classificação do IBGE, seguido por mulheres brancas (35%) e negras (8%). 
 
Campanhas lançadas pelo governo, como a #Mulheres Rurais, Mulheres com Direitos, buscam trazer conscientização e ampliar os direitos da população feminina rural, alinhando-se ao cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável estabelecidos pela ONU em promover a igualdade de gênero e o fim da pobreza no campo. Um dos principais pilares da campanha, que ocorre todos os anos desde 2015, é a produção sustentável de alimentos alinhada à segurança alimentar. 
 
A luta das mulheres no campo passam também por pautas como acesso à inovação e a novos recursos e sistemas produtivos, de forma a aumentar a apropriação da tecnologia e da ciência pela população feminina. Outra questão encabeçada por elas é a luta pela Reforma Agrária ampla, a ocupação de terras improdutivas, a valorização da agricultura familiar, que produz a grande maioria dos alimentos consumidos pelos brasileiros, e as novas regras da previdência.  
 
Segundo o IBGE, as mulheres que vivem no campo e possuem mais de 15 anos correspondem a 11 milhões de pessoas. Pelo menos metade delas é economicamente ativa, sendo que mais de 30% ganham entre meio e um salário mínimo. Outras 30% nem sequer têm rendimentos. Os dados também apontam que de 70% a 80% dos alimentos para consumo, principalmente auto consumo, são produzidos por mulheres. Dessa forma, apesar da falta de reconhecimento, as mulheres rurais são quem de fato alimentam a população do campo.
 
Para mudar essa realidade, algumas medidas públicas têm sido tomadas e políticas governamentais têm ganhado corpo nos últimos 10 anos para envolver a população feminina urbana em suas demandas, entender suas histórias e trazê-las para o protagonismo da discussão. O Brasil ainda está a muitos passos de promover políticas públicas que de fato fazem a diferença, principalmente em relação a coleta de dados para traçar planos factíveis para o empoderamento feminino no campo. 
 
A realidade das mulheres do campo é muito semelhante regionalmente. Estudos mostram que a pobreza atinge quase 60 milhões das pessoas que vivem nas áreas rurais dos países da América Latina. A extrema pobreza chega a 22,5% da população rural latino-americana, sendo que a maioria das pessoas nessa situação são mulheres. 
Em parceria com a ONU, o IBGE têm traçado políticas para coletar dados sob a perspectiva de gênero para que algumas políticas públicas comecem a ser implantadas para mudar essa realidade. Enquanto isso, a taxa de mortalidade infantil no campo continua alta para os padrões internacionais, assim como a mortalidade materna. A expectativa de vida das mulheres no campo não passa dos 72 anos de idade, enquanto a média brasileira para o sexo feminino é de 80 anos.