Maior painel de grafite do mundo conta história de tribos indígenas em São Paulo
Por Silvana Cardoso, Jornalista- RJ
Chefe de reportagem: Juliana Monaco, Jornalista
Diretora de jornalismo: Letícia Fagundes, Jornalista
Através do grafite, uma exposição permanente a céu aberto narra a história de São Miguel Paulista, na Zona Leste de São Paulo, a partir das origens indígenas do bairro. Tribos de São Miguel é a história recontada e renovada pela arte urbana de dez grafiteiros que estão restaurando um muro de 1 km de área na Avenida Doutor José Artur Nova. Com 220 quadros que retratam a passagem de diversas tribos que originaram a sociedade e cultura local, o projeto também busca gerar oportunidades de renda a artistas do setor criativo do bairro no registro de sua própria história por meio do grafite. Desejam também aproximar os moradores locais dessa cronologia e estimular o autopertencimento do cidadão na sua região de moradia, com o desenvolvimento de atividades artísticas, bem como por meio de oficinas culturais gratuitas nas escolas públicas da região.
Considerado o maior painel histórico de grafite do mundo, a pintura segue cronologicamente a história do bairro, antes chamado de distrito “Penha de França”, formado a partir de três etnias indígenas, a chegada dos portugueses e os conflitos com as comunidades tradicionais, a migração nordestina e a imigração de japoneses, portugueses e israelenses em seu processo de desenvolvimento até se tornar um dos locais mais populosos de São Paulo, com mais de 370 mil moradores, segundo dados do IBGE do ano de 2000. Entre questões sociais, o conjunto de bairros da Zona Leste possui também índices que indicam como um ótimo local para se morar, bem como, em 2020, quatro bairros da região estavam em alta no mercado imobiliário. Para tentar suprir essas diferenças estruturais de oportunidades, as oficinas promovidas pelo projeto são dirigidas a estudantes do ensino fundamental ao médio e têm abordagens diferentes de acordo com o que está sendo aprendido em aula, de forma teórica e prática. “Muitos professores têm vindo nos procurar para apoiar o projeto e estimular a volta às aulas, que estão acontecendo presencialmente em até 30% de capacidade”, conta Rozendo.
“Fizemos seis meses de pesquisa, entrevistamos moradores antigos, visitamos museus e o acervo da própria Nitro Química, empresa patrocinadora do projeto, que nasceu no bairro em 1935 e, por muitos anos, tinha seu apito como um ‘relógio’ para a comunidade”, conta Edimilson Rozendo, pedagogo à frente da pesquisa histórica do projeto. “Também encontramos imagens de uma balsa que fazia a travessia de pessoas em uma época em que o rio Tietê era navegável, essa foi uma lembrança afetiva dos moradores antigos”, complementa o grafiteiro e arte-educador Manulo.
Possibilitado pelo Pro-Mac SP (Programa Municipal de Apoio a Projetos Culturais), a intervenção cultural “Tribos de São Miguel“ joga luz ao grafite, que ganhou o mundo com artistas renomados, mas que conquistou em primeiro lugar os corações dos jovens periféricos mundo afora. “Escolhemos o grafite para fomentar a arte de forma acessível e a céu aberto como um trabalho de ativismo que conta a história real do bairro, a partir de nossos povos originários, em uma timeline escrita e pintada que destaca vários estilos de grafite. Geramos renda aos artistas e suas famílias e aos fornecedores da região, além da divulgação de seus serviços. Para além do muro, também estimulamos a street art em oficinas e workshops nas escolas públicas, isso sem falar nas melhorias de zeladoria da avenida, que acaba se recuperando com a pintura de postes e calçadas e a limpeza dos canteiros”, explica Luan Flavio, coordenador do projeto. Mas o coordenador pretende levar o projeto para outros bairros da capital paulista, bem como para outras cidades de São Paulo, já que cada bairro ou cidade tem sua história própria, independente do que está nos livros. Tribos, imigrantes que, muitas vezes, não são citados na história oficial, mas que seus moradores saberão contar sobre seus primeiros habitantes. Para isso, Luan trabalha com pesquisadores e historiadores que fazem o estudo minucioso e trazem essas histórias à tona.
Histórias que ligam o muro de São Miguel Paulista de ontem ao restauro promovido agora, como de Jessica Cat, que quando pequena curtia ver os muros grafitados pela rua. Foi só participar de uma oficina de grafite, em 2013, para se envolver no movimento. Ela também faz parte do “Donas do Rolê”, coletivo voltado para mulheres que visa mostrar a força feminina e seu empoderamento no Hip-Hop, na música como DJ, desenvolvendo artes nos muros, soltando a voz nos microfones como MCs, e o swing do Break. “Recontar a história dos índios é uma enorme responsabilidade e alegria também, porque, através da arte que estamos retratando, os moradores irão conhecer ainda mais a trajetória do bairro e se sentirem bem aqui”, pontua. Já Alexsandro Gomes dos Santos, o Chuk, tinha “uns 15” anos quando o grafite surgiu em sua vida e, desde então, nunca mais parou com a Arte Urbana. Hoje, aos 36 anos, o artista e morador do bairro tem formação acadêmica em Artes Visuais e é Mestre em Políticas Públicas: “E pretendo continuar lecionando oficinas de arte para ajudar na formação de jovens”, ressalta.
Tribos de São Miguel tem previsão de inauguração na primeira semana de julho de 2021 e já vale colocar no roteiro de viagem a capital paulista um passeio pela Avenida Doutor José Artur Nova, em São Miguel Paulista.
Fotos: Divulgação/Tribos de São Miguel