Repórter Luiza Pinheiro-Rio de Janeiro

Viajar é indiscutivelmente uma das melhores coisas do mundo. Cada pessoa tem uma finalidade diferente para começar uma jornada por algum lugar. Alguns almejam conhecer novas culturas, outros querem curtir festas e lugares animados e ainda tem aqueles que procuram autoconhecimento. A busca pela liberdade de poder escolher para onde se quer ir na hora que quiser é um fator-chave para quem escolhe viajar solo. No entanto, ainda se tem um certo receio de se viajar sozinha sendo mulher.

 

Uma pesquisa revelada pela Booking.com, feita em março deste ano, mostrou que 62% das mulheres latino-americanas já fizeram pelo menos uma viagem sozinhas. Entre os motivos para isso estão a liberdade de escolher o destino, a falta de companhia, busca por autoconhecimento e a vontade de conhecer pessoas novas. Esse é um número bom e que vem crescendo mais, já que o preconceito e receio estão diminuindo. No entanto, não se deve negar que as mulheres podem ser mais suscetíveis a determinados perigos. De acordo com o estudo, 17% das mulheres latino-americanas sentem medo e insegurança quando o assunto é viajar sozinha. É claro que há situações e lugares onde tem mais riscos, mas isso não pode te abalar e fazer desistir de algo se for o que você realmente quer.

Por isso, hoje em dia existem diversos aplicativos, plataformas e guias para ajudar a mulher a fazer uma viagem tranquila na qual ela se sinta bem. A Plataforma Sister Wave, por exemplo, promove uma rede de acomodação totalmente feminina, dando segurança a quem se hospeda e a quem recebe a viajante. Além dela, há também a BlaBlaCar – Só para elas, plataforma de caronas a longa distância voltada para mulheres; Life360, app que possibilita o compartilhamento da sua localização; e “Vamo Comigo?”, aplicativo que conecta mulheres que estão indo para um mesmo destino na mesma data. Algo importante também, ao decidir viajar sozinha, é escolher o lugar ideal, que se adequa melhor à pessoa e com menos risco.

O “Women’s Danger Index”, estudo realizado pela Asher & Lyric, listou 50 países, do mais perigoso ao mais seguro para mulheres, levando em consideração aspectos como segurança ao andar sozinha à noite, índice de homicídios de mulheres, discriminação e desigualdade de gênero. África do Sul, Brasil, Rússia, México e Irã foram eleitos os cinco mais perigosos, enquanto Espanha, Singapura, Irlanda, Áustria e Suíça são os melhores para se visitar.

Na estrada selvagem

Tudo começou porque a cicloviajante Cris Oliveira sempre sonhou em conhecer o México. Ela já fazia parte de um grupo de pedal só para mulheres em Porto Alegre, onde vivia, e sempre dizia que queria pedalar até o país. Ninguém levava a sério. Até que decidiu vender o que tinha, deixar um emprego fixo e uma sociedade em um bar para subir em uma bicicleta de bambu, que ela mesma fez, e sair por aí viajando sozinha. “Foi a melhor coisa da minha vida. O aprendizado é enorme, é você e você. Não tem como pedir ajuda pra ninguém. É um pouco sofrido, mas no geral é muito bom”, descreve.

 

Durante sua jornada pela estrada, Cris viu algumas outras mulheres nessa rota, mas apenas uma sozinha como ela. Em um ano e meio fora do país por causa de sua viagem, ela conta que voltou com um saldo bem positivo em questão de segurança, já que não passou por nenhuma situação de risco maior, mesmo em uma América Latina machista e assediadora. Para isso, ela aderiu a um estilo de vida específico. “É claro que viajar sozinha é muito mais perigoso, então em vários momentos eu me tornei uma pessoa muito mais selvagem em tudo, nos instintos, na forma de comer, no geral”, exemplifica.

A cicloviajante relata que conheceu muitos homens durante seu caminho e que poucos deles viajavam sozinhos, pois eles também têm bastante medo, e afirma que para a mulher começar a sua jornada individual, ela já é empoderada. “Para chegar nesse ponto de viajar sozinha, a mulher já está em um momento forte da sua vida, no qual ela pode encarar isso. Então ela busca a liberdade. É esse o ponto, ela quer estar livre e desfrutar desse poder todo que ela tem”, elucida. Apesar de atualmente seguir muito seus instintos, Cris afirma não poder aconselhar outras pessoas a fazerem isso também. “Eu acredito muito nos meus instintos, eles ficaram mais selvagens e mais apurados, mas é difícil dizer para outras mulheres fazerem isso se os delas não estão assim ainda”, explica.

No entanto, algumas dicas são gerais como: usar a informação a seu favor, revertendo o jogo sempre que houver algum desconhecido fazendo muitas perguntas, avisar a um parente ou amigo onde está e para onde vai e se precaver sempre. “Eu durmo com o canivete perto para o caso de escutar qualquer coisa enquanto estou dormindo. É um instinto de sobrevivência mesmo, principalmente quando tenho de fazer acampamento selvagem, porque a natureza nunca vai te fazer mal, mas as pessoas podem fazer”, esclarece.

Manu no Mundo

A blogueira de viagem Emmanoele Muniz acredita que ainda existe um grande tabu sobre viajar só, já que muitas pessoas confundem estar sozinha naquele momento com uma vida solitária.

Muita gente ainda pergunta “mas cadê o seu marido?” e “por que viajar sozinha?”. Ela conta conhecer mulheres que já mentiram ou omitiram que estavam viajando sozinhas como forma de evitar piadas ou assédio. “As mulheres estão viajando solo porque têm exemplos, querem ter experiências próprias e estão com dinheiro e oportunidade. Nós viajamos sozinhas desde sempre e estamos aqui para continuar”, ressalta.

 

Morando nos Estados Unidos desde 2015, a primeira experiência que teve sozinha foi ao visitar o Chile. Amou tanto que começou a emendar suas viagens. “É uma conexão com meu tempo, minhas fraquezas, limitações, mas acima de tudo com minhas virtudes e com quem realmente sou”. Hoje, mesmo casada, ela diz que continua viajando individualmente de vez em quando. “Já fui para Malta, Amsterdã e várias cidades dos Estados Unidos, a última viagem sozinha foi para Nashville em novembro”, acrescenta. Com o blog Manu no Mundo, Emmanoele compartilha suas experiências sobre viajar sozinha e apenas com mala de mão.

Ela criou a plataforma em 2003, quando se chamava Menu Manu, mais direcionada a falar sobre restaurantes. Quando foi para os Estados Unidos, decidiu retomar a ideia e começou a escrever para amigos e família até que mais pessoas foram chegando. Para viajar sozinha da melhor forma possível, ela explica que é importante escolher destinos que tenham boas referências como hospedagem, atividades e idioma. Além disso, montar um planejamento e compartilhar com amigos próximos ou família, pode gerar mais segurança. A blogueira conta que já viu mulheres usarem spray de pimenta e que é recomendado para alguns lugares, mas ela nunca utilizou. Ficar mais atenta, não beber muito e estar sempre no controle são outras dicas que Manu destaca.

É importante ter atenção, mas também não se pode entrar em paranoia. “Se não está segura, ainda não é o momento. Se respeite e aguarde a hora certa. Não é nada demais, é como ir fazer a unha ou qualquer outra coisa que se faz consigo mesma”, declara.

Com livro e tudo mais

A consultora e blogueira de viagem Flavia Goulart escreveu o livro “Tô indo viajar sozinha” para incentivar e dar dicas a outras mulheres de como se preparar para uma viagem solo. Na obra, ela relata histórias de suas aventuras e fala sobre como lidar com medos, sobre segurança, como tirar boas fotos estando só, entre outras coisas.

 

Ela conta que explora o mundo sozinha desde 2008, quando fez um mochilão de 80 dias pela Europa e desde então, não parou mais. “Amo muito viajar sozinha, prefiro assim, embora viaje com outras pessoas também. Viagem solo para mim é mais do que conhecer um destino, é conhecer a si mesma”, revela. Vietnã, Tailândia e Rússia foram os países que a consultora de viagem mais gostou de conhecer até hoje. Ela costuma dizer que qualquer local é bom para ir sozinha, desde que a pessoa queira conhecer, sempre respeitando ambientes que estejam em guerra ou que sejam muito conservadores para mulheres. “Sugiro também conversar e pesquisar sobre mulheres que já foram para o destino escolhido se estiver receosa, porque muita gente compartilha mitos sobre insegurança em determinados locais”, aconselha.

Ela ainda instrui a deixar seu itinerário com alguém de confiança, se conectar à internet durante toda a viagem, não andar com muito dinheiro durante os passeios, planejar bem a viagem, escolher hospedagens em locais seguros, evitar chegar em destinos novos à noite, ler sobre o lugar, sua cultura e vestimentas, evitar sair sozinha à noite e não beber a ponto de perder a consciência.