Por Luciana Piris, jornalista
Chefe de reportagem: Juliana Monaco, jornalista
Diretora de jornalismo: Letícia Fagundes, jornalista

Crianças e adolescentes que vivem em um ambiente com pressão psicológica causada por toxicidade podem vir a ter reações exacerbadas, medo, insegurança, apatia e baixa autoestima

Ter filhos é uma das realizações de muitas pessoas. E, muitas vezes, acompanhar esse crescimento faz com que a ótica dos pais sempre visualize o filho como aquele bebê que aprendeu a se alimentar, a andar e a brincar de pés descalços no parque perto de casa. Essa ótica, para a maioria dos filhos, afeta a autoestima e o desenvolvimento pessoal em seu desenvolvimento na vida adulta.

As relações familiares devem ser baseadas no desenvolvimento de cada filho, respeitando as suas características individuais. Para a mãe Nara Werneck, é importante respeitar a fase de cada filho, evitar comparações e estimular o desenvolvimento para que sinta o poder do acolhimento afetivo. “Tenho dois filhos totalmente diferentes. Preciso estimular o mais velho a encarar novos desafios, a seguir a rotina. O mais novo é justamente o contrário, tenho que controlá-lo para que não faça inúmeras atividades, festas e encontros e não seja prejudicado com isso.” 

Para a psicanalista Andrea Ladislau, as atitudes dos pais devem ser observadas buscando compreender se os limites pessoais e individuais dos filhos são respeitados. Existe espaço para um diálogo saudável e assertivo na família, definidos os papéis daquela estrutura familiar. Assim configura um ambiente leve e equilibrado. “Qualquer coisa diferente disso pode indicar a toxicidade”, explica.

Pais tóxicos são muito prejudiciais ao desenvolvimento dos filhos. Geralmente, falam que o filho não vai conseguir, não tem capacidade para conseguir dar conta do recado, e acabam encobrindo o despertar de seus filhos.

Vale ressaltar que tudo que causa controle excessivo ou gera desconforto, insegurança e instabilidade pode estar associado às relações tóxicas. Como  explica Ladislau, relações que tiram nosso equilíbrio emocional por um longo período de tempo. “Se a comunicação entre os membros da família é pesada, marcada por descontrole, insultos, cobranças excessivas, cerceamento da liberdade e manipulações por parte dos genitores, sem dúvida, a toxicidade está presente”, explica.

Para a estudante e adolescente Lia Correia, é muito difícil lidar com a toxidade dos pais. Eles se separaram há dez anos. Hoje, Lia mora com a avó, e durante seu crescimento sempre presenciou o pai ou a mãe discutindo por causa de assuntos banais, como a escolha da mochila que iria usar no passeio da escola. “Cresci sendo assim e sempre tive minha avó para me ajudar a compreender que o problema não era comigo, e sim imaturidade dos meus pais em lidar com a situação”, explica.

De acordo com Andrea Ladislau, a primeira coisa a fazer é buscar identificar essa toxicidade. Esse abuso psicológico de pais sobre os filhos não surge de um dia para o outro. “É uma dinâmica que precisa ser reconhecida e identificada, e certamente, tem sua origem na infância”, explica. 

Após essa identificação, é preciso estabelecer limites reais, posicionando-se e buscando se colocar diante das situações, expressando seus desejos, sentimentos e emoções individuais. Além disso, a ajuda de uma profissional de saúde mental é muito importante para ajudar a esclarecer o desempenho dos papéis familiares, evitando assim a continuidade dos traumas e sofrimentos. O objetivo é recuperar a autoestima e a segurança pessoal para construir uma vida independente e saudável física e mentalmente, através do amadurecimento e do autoconhecimento. A melhor maneira é através do diálogo assertivo e consciente, evitando o acúmulo de culpas e responsabilizações infundadas. Porém, se após essas tentativas não conseguir êxito, a dura realidade mostra que o ideal é o rompimento ou diminuição do contato, se possível, para minimizar os atritos e dores emocionais.

Para a fonoaudióloga Sabrina Silva, foi muito difícil crescer com pais tóxicos, pois sempre falavam que ela não ia conseguir ser uma profissional e se manter no emprego, que nenhum namorado prestava e nada que fazia estava bom. “Através da terapia, percebi que não precisava agradá-los a todo instante, tinha uma vida a ser construída. Tentei conversar com eles, não fui ouvida. E sem deixar de respeitá-los, acabei conseguindo reformular minha vida. Hoje, sou feliz e entendo como foram criados e as dores que tiveram, mas isso não significa que eu tenha que passar por isso também”, conclui.