Repórter Clara Maria Lino, Rio de Janeiro

 

Entre os principais motivos da evasão das jovens estão em destaque os afazeres domésticos, os cuidados de pessoas, a gravidez e a menstruação. No Brasil, dos pouco mais de 47 milhões de jovens com idades entre 15 e 29 anos, 11 milhões não estudam, não trabalham e nem se qualificam para o mercado. Destes 11, mulheres e pessoas pretas e pardas são maioria. Pouco mais de sete milhões se consideram pretos ou pardos e quase sete milhões são mulheres.

Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) realizada em 2018 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Uma pesquisa mais recente realizada pela Síntese de Indicadores Sociais (SIS) do IBGE em 2019, mostra que entre as jovens com idades de 25 a 29 anos consideradas “nem-nem” (nem estudam nem trabalham), quase 68% estão fora da força de trabalho, ou seja, não procuram emprego.

O estudo feito pela Fundação Abrinq em 2019 aponta que 20% das mães brasileiras não terminaram o Ensino Fundamental. Isso representa um período inferior a sete anos de estudo. Entre as jovens com até 19 anos, 30% não concluíram este mesmo ciclo. Ainda segundo a pesquisa, as regiões com os maiores índices de evasão entre as mulheres são o Norte e Nordeste do país que juntos somam 35% das mulheres.

Entre os principais motivos da evasão das jovens na educação e no mercado de trabalho estão em destaque os afazeres domésticos, cuidados de pessoas, gravidez, menstruação, distância da unidade de educação e dificuldades com transporte público. As duas últimas barreiras citadas neste texto são sofridas por meninos e meninas, mas as duas primeiras representam a ausência de mais de 24% das jovens.

Para os meninos esse número despenca, apenas 0,7% deixam os estudos para realizar afazeres domésticos ou cuidar de pessoas. Em oposição as informações apresentadas está a paulista Lauany Santos, de 19 anos. Aos 18, a jovem de Guarulhos, região metropolitana de São Paulo descobriu a gravidez.

Em entrevista para esta reportagem, a professora de inglês conta que foi difícil o momento da descoberta, mas que até hoje recebe o apoio dos pais. “Foi um choque tanto pra mim como pra minha família, sou filha única. No início foi bem complicado, mas aos poucos fui dando conta de toda situação e tomei pra mim que tudo tem seu momento certo pra acontecer.”

Recém-formada no ensino médio e já matriculada na faculdade de jornalismo, Lauany sonha em seguir a profissão no esporte e acrescenta que procura não romantizar a maternidade precoce. “Filho toma muito nosso tempo. Por mais que seja maravilhosa a maternidade, eu não a romantizo. Meninas que são novas, se cuidem, se preservem. Filho é bom, mas no momento certo e com a pessoa certa.”

Na Câmara dos Deputados, a deputada Marília Arraes (PT-PE) apresentou o Projeto de Lei (PL 4968/19) que cria um programa de fornecimento de absorventes higiênicos para alunas dos ensinos fundamental e médio das escolas públicas. De acordo com a Câmara, o PL está em análise. Segundo a deputada, caso o projeto seja aprovado, a distribuição será realizada através de máquinas de reposição que ficarão nos banheiros das escolas.

Em capitais como Rio de Janeiro e Vitória já houveram discussões e aprovação dos projetos na Câmara dos Vereadores de cada capital. Já em Curitiba e no Estado de São Paulo, a ideia está em análise na Câmara e na Assembleia, respectivamente. Caso o projeto da deputada Marília Arraes seja aprovado e se torne lei federal, todo o território vai contar com a distribuição obrigatória de absorventes higiênicos em unidades públicas de ensino.

 

No mundo, a cidade de Nova Iorque, nos Estados Unidos, já distribui absorventes higiênicos em escolas públicas, abrigos e prisões desde 2016. Em países como Índia, Nepal, Afeganistão e Uganda, o índice de meninas que deixam a escola após ficarem menstruadas pode chegar a 40%. De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU) e com o canal de notícias inglês BBC, cerca de 20% de evasão na Índia, 30% no Nepal e no Afeganistão, e 40% na Uganda.

 

O documentário “Absorvendo o Tabu” (Period. End of Sentence), de 2018, da Netflix, vencedor do Oscar de Melhor Documentário Curta-Metragem 2019, apresenta um vilarejo no interior da cidade de Delhi, na Índia, em que uma máquina produz absorventes biodegradáveis. O curta de 26 minutos mostra como este equipamento esta mudando a vida das mulheres nativas. Antes dessa inovação, indianas recorriam a cinzas para maior absorção, jornais, areia, folhas secas e panos. Além deste tabu e da óbvia ameaça de infecção, meninas indianas passam por constrangimento, vergonha e atitudes machistas que as fazem desistir dos estudos.

 

Um levantamento realizado no país aponta que das 14.724 unidades públicas de ensino da Índia, somente 53% (aproximadamente 7.800) possuem banheiros femininos. Na Uganda, Catherine Nantume luta contra a estatística do país africano através da máquina de costura. Uma em cada 10 meninas não vai a escola durante o período menstrual. Com isso, ela ensina as jovens estudantes a produzir absorventes higiênicos e reutilizáveis. Parte da produção é destinada a escolas em áreas rurais.