Por Letícia Fagundes, jornalista

Caso brutal em Tramandaí expõe a falência do sistema penal e o desespero da população

Tem doze dias que escrevi sobre a jornalista Vanessa Riccardi, assassinada pelo ex-noivo. Doze dias desde que uma mulher foi brutalmente morta por um homem que deveria estar longe dela. E agora estou voltando aqui para falar sobre o que gostaríamos que acontecesse com estupradores.

Há quem diga que matar não é a solução. Mas e quando não há outra? E quando a justiça se recusa a ser justa?

Imagine alguém que você ama profundamente. Uma mulher, uma idosa, uma criança, uma gestante. Uma pessoa indefesa, vulnerável. Agora, imagine essa pessoa sendo brutalmente abusada, torturada, jogada em um buraco escuro, amarrada, enquanto um criminoso – reincidente, já conhecido da polícia – comete os atos mais repugnantes contra ela. O tempo passa, alguém denuncia, a polícia chega. O agressor é preso. Mas, como já aconteceu tantas vezes antes, ele tem acesso a uma defesa eficiente, se beneficia de brechas na lei e, em pouco tempo, volta às ruas para seguir sua vida, enquanto sua vítima nunca mais será a mesma.

Essa não é uma hipótese remota. Esse é o retrato do Brasil. E, desta vez, aconteceu em Tramandaí, no Rio Grande do Sul. Uma menina foi encontrada amarrada em um buraco dentro de um bar, sendo violentada por um homem com ficha criminal extensa. A população, revoltada, decidiu não esperar pela justiça. Linchou o agressor.

O episódio escancara uma realidade incômoda: o povo está farto. O povo está ciente de que confiar no sistema penal brasileiro é um ato de ingenuidade perigoso. O povo sabe que, mais cedo ou mais tarde, um criminoso como esse andaria livremente entre nós. E é aí que surge a pergunta inevitável: se a justiça não protege os inocentes, como esperar que a sociedade permaneça passiva?

O ciclo da impunidade

O Código Penal brasileiro prevê penas severas para crimes como estupro e cárcere privado:

• Estupro (Art. 213 do Código Penal) – Pena de 6 a 10 anos de reclusão, aumentada caso a vítima seja menor de idade.

• Cárcere privado (Art. 148 do Código Penal) – Pena de 1 a 5 anos de reclusão, agravada caso a vítima seja vulnerável.

No papel, as leis existem. Na prática, falham. A progressão de regime, as audiências de custódia e a falta de estrutura investigativa tornam a punição uma exceção, e não a regra. O agressor de Tramandaí não era um novato no crime. Sua ficha policial já era extensa. Mas, como tantos outros, seguia livre.

Justiça seletiva, prioridades equivocadas

Enquanto criminosos reincidentes encontram respaldo jurídico para continuar circulando livremente, as vítimas são esquecidas. As mulheres, que deveriam ser protegidas, têm suas pautas constantemente empurradas para segundo plano em meio a disputas políticas e interesses financeiros. Fala-se de tudo, mas não da realidade brutal da violência de gênero.

E o que acontece quando a justiça ignora os alertas da sociedade? O povo responde. A história de Tramandaí não é sobre um linchamento. É sobre o colapso da confiança no Estado. É sobre um sistema que normaliza a impunidade a ponto de forçar cidadãos a tomarem decisões desesperadas.

Até quando?

O caso de Tramandaí não será o último. Outros virão, e a resposta popular será cada vez mais intensa. Enquanto o Brasil continuar permitindo que criminosos reincidentes voltem às ruas, enquanto a segurança pública for tratada com descaso, enquanto as vítimas forem deixadas para trás, a violência não diminuirá. Pelo contrário, ela apenas mudará de forma.

Se a justiça não se impõe, a brutalidade toma seu lugar. Esse é o retrato do país. E ele está longe de mudar.