Quais as consequências do lixo para a vida marinha?
Por Giselle Cunha, Jornalista- RJ
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Diretora de jornalismo: Letícia Fagundes, Jornalista
Chefe de reportagem: Juliana Monaco, Jornalista
Editora de conteúdo – Site MJ: Beatriz Azevedo, Jornalista
Conheça o grande vilão dos mares e como podemos ajudar fazendo a nossa parte
Criado há pouco mais de 100 anos, o plástico revolucionou as indústrias e mudou, de uma vez por todas, a rotina de famílias ao redor do mundo. A madeira, os pelos de animais, os vidros e panos deram espaço para a criação de utensílios modernos e, a princípio, inofensivos, pois não ofereciam risco de quebrar, possuíam leveza e geravam economia. Porém, por não se tratar de um material orgânico (matéria de origem animal ou vegetal), fez com que o seu consumo e descarte desenfreado gerassem sérios danos aos animais e à natureza. A produção mundial desse elemento passou de 1,5 milhões de toneladas em 1950 para 265 milhões de toneladas em 2010.
Cenário Preocupante
De acordo com um relatório apresentado pela ONG Oceana Brasil em 2020, o Brasil é responsável por descartar 325 mil toneladas de plásticos em mares através de lixões ao céu aberto. Um número bastante expressivo e preocupante, pois o relatório também cita que mais de 3,7 mil animais necropsiados haviam ingerido resíduos plásticos e 1em cada 10 animais que ingeriram plástico morreram.
A partir 2010, as preocupações globais com a reciclagem e as alternativas de produção que gerassem menor impacto ao meio ambiente tomaram uma atenção especial, mas até hoje não conseguimos colocar em prática soluções eficazes. Estudos indicam que essa possível melhora ocorra com a diminuição do consumo de plástico e não com a adaptação da fabricação, conforme a tentativa dos últimos anos. Também ressalta a importância das empresas pegarem pra si essa responsabilidade e não aguardar que a decisão seja feita pelo consumidor final.
O Instituto Mulheres Jornalistas entrevistou o Dr. Luiz André Monteiro de Albuquerque, advogado, ambientalista e coordenador da Subcomissão de Animais Marinhos da Comissão de Proteção e Defesa dos Animais da OAB/RJ.
Mulheres Jornalistas (MJ): Existe algum levantamento de quantos animais morrem por ano devido à intoxicação ou ingestão de lixo nos mares e oceanos?
Dr. Luiz André: Segundo dados levantados pela União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), estima-se que até 1 milhão de pássaros marinhos e 100 mil mamíferos marinhos possam ser mortos anualmente em decorrência da enorme quantidade de lixo que são descartados nos mares.
A cada ano, a ingestão de resíduos sólidos atinge milhares de baleias, golfinhos, focas, tartarugas marinhas etc.,causando uma séria ameaça à biodiversidade marinha.
MJ: Quais tipos de lixo são mais nocivos para a vida marinha?
Dr. Luiz André: O plástico é o tipo de lixo mais encontrado nos oceanos, principalmente o chamado microplástico, considerado um dos principais poluentes. Para que se tenha uma idéia do volume do lixo que chega aos mares e oceanos, a Associação Internacional de Resíduos Sólidos (ISWA) realizou um estudo sobre poluição marinha e constatou que 25 milhões de toneladas de resíduos são despejados nos oceanos a cada ano, sendo que 80% deste total são provenientes das cidades. Este mesmo estudo indicou ainda que metade do lixo que termina nos oceanos é plástico, ou seja, 12,5 milhões de toneladas de plástico.
Um trabalho realizado no Brasil pelo Projeto Tamar, que luta pela preservação das tartarugas marinhas, apresentou dados impactantes do alto potencial do lixo em causar a morte nestes animais. Como exemplo, o plástico considerado descartável, como canudos, copos e sacos, foi encontrado em 89% das tartarugas marinhas.
Outros materiais que também são muito nocivos para a vida marinha são os petrechos de pesca, como anzóis, linhas e redes.
MJ: Quais as espécies marinhas ameaçadas de extinção atualmente?
Dr. Luiz André: Os últimos estudos identificaram que vários animais marinhos estão ameaçados de extinção, sendo uns mais que os outros. No final de 2020, a União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) divulgou uma nova relação das espécies marinhas ameaçadas. Listo abaixo alguns destes animais:
- Vaquita (Phocoena sinus);
- Baleia-azul (Balenoptera musculus);
- Baleia-franca do norte (Eubalaena glacialis);
- Tartaruga-de-couro (Dermochelys coriaca);
- Tartaruga-de-pente (Eretmichelys imbricata);
- Toninha (Pontoporia blainvillei);
- Peixe-boi marinho (Trichescus manatus linnaeus);
- Tubarão-frade (Cetorhinus maximus);
- Tubarão-baleia (Rhincodon typus);
- Tubarão-martelo (Sphyrna mokarran).
MJ: Como é realizada a fiscalização das empresas sobre a responsabilidade ambiental?
Dr. Luiz André: Os agentes de fiscalização, fundamentais para a preservação ambiental, comparecem nas empresas para a verificação do cumprimento das normas ambientais existentes e impedir a prática de crimes relacionados. Caso algo esteja em desconformidade com a lei ou se constate a existência de crime ambiental, podem ser aplicadas multas, realizadas apreensões e embargos de obras etc.
Para que esta fiscalização ambiental possa ocorrer de forma satisfatória e integral, ela é compartilhada pelos vários entes da federação (União, estado, Distrito Federal e municípios).
Na esfera federal, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (IBAMA) é o órgão competente pela fiscalização ambiental, conforme a Lei de Crimes Ambientais, Lei nº 9.605/98.Todavia, visando garantir a ampla defesa do meio ambiente, foi criada a Lei Complementar Federal nº.140/2011 que regulamenta a competência comum entre os entes federativos e fixa normas de cooperação entre eles, reduzindo assim as superposições e conflitos de atuação, tornando o processo de licenciamento ambiental mais ágil, menos burocrático e oneroso.
MJ: A lei 8.473/19 sobre as novas regras de utilização das sacolas plásticas completou 2 anos em junho. Porém, vemos muitos estabelecimentos se beneficiando da cobrança das sacolas ao invés de incentivar trocá-las pelas retornáveis. Existe alguma ação, cujo benefício seja realmente voltado para o meio ambiente?
Sustentabilidade é uma necessidade real. Diversas ações podem beneficiar realmente o meio ambiente, mas, todas elas dependem de uma mudança de comportamento humano.
Posso citar a coleta seletiva de lixo como sendo uma ação cujo benefício é realmente voltado para o meio ambiente. Isto porque, além de reduzir as emissões de CO2 no ar, evitam a poluição do solo e lençóis freáticos, além de ruas e esgotos. Descartados incorretamente nas vias públicas, os resíduos provocam excesso de lixo nas bocas de lobos e bueiros, causando enchentes e atraindo ratos e baratas que causam doenças aos seres humanos, ocasionando também reflexos no sistema de saúde.
No caso das empresas, várias práticas sustentáveis já são adotadas, como a adoção de documentação eletrônica; a redução do consumo de descartáveis; a utilização de equipamentos econômicos; o descarte correto de lixo eletrônico etc.
Com relação ao tema sacolas plásticas, em alguns estados, como o Espírito Santo, existem leis que proíbem supermercados, padarias, farmácias, atacadistas e outros estabelecimentos congêneres de distribuírem (de forma gratuita ou cobrando) sacolas ou sacos plásticos descartáveis compostos por polietilenos e/ou similares, devendo substituí-los por sacolas e/ou sacos plásticos reutilizáveis/retornáveis/recicláveis ou confeccionados com material bioplástico. Entretanto, muitos estabelecimentos ainda relutam em incentivar a troca das sacolas plásticas pelas retornáveis, infelizmente.
Todavia, temos uma chance de ver uma melhora neste cenário a partir do segundo semestre deste ano, pois o Supremo Tribunal Federal (STF) irá julgar a constitucionalidade de uma lei do município de Marília/SP que exige a substituição de sacos e sacolas plásticas por material biodegradável.
Como este julgamento no STF tem repercussão geral, ou seja, o resultado será aplicado a ações aguardando julgamento em todo o país sobre a questão, é possível que tenhamos um verdadeiro avanço em relação ao tema, que trará grandes benefícios para o meio ambiente.
MJ: Quais pequenas ações podemos fazer no dia a dia para contribuirmos com o meio ambiente?
Dr. Luiz André: Cada um de nós pode contribuir com pequenas mudanças que podem fazer uma grande diferença para o meio ambiente. Dentre elas, podemos citar algumas ações individuais como reciclar, reusar ou reutilizar materiais; não utilizar plásticos desnecessários e descartáveis como copos, pratos, talheres, canudos e sacolas de compras de uso único; ajudar a limpar um parque, uma praia ou córrego perto de sua casa; não descartar resíduos sólidos de forma irregular e ilegal; uso consciente da água e energia elétrica etc.
São pequenos detalhes que certamente ajudarão a salvar uma vida, seja de um animal de grande porte como uma baleia, ou um pequeno, como um caranguejo.