Outubro Rosa
Por Ana Joulie, Psicóloga especializada em patologias graves, fundadora e diretora clínica da Rede Internacional de Acompanhamento Terapêutico (RIAT)
anajoulie@riat.app
Diretora de jornalismo: Letícia Fagundes, Jornalista
Chefe de reportagem: Juliana Monaco, Jornalista
Editora de conteúdo – Site MJ: Beatriz Azevedo, Jornalista
Que aspectos psicológicos podem exercer função direta nas células cancerígenas?
Estamos em outubro e, por conseguinte, inseridos em um movimento internacional de conscientização para o controle do câncer de mama. A campanha mundial tem o objetivo de compartilhar informações e promover a conscientização sobre a doença, proporcionar maior acesso aos serviços de diagnóstico e de tratamento e contribuir para a redução da mortalidade. A campanha também proporciona atenção aos aspectos de Saúde Mental.
Vamos conhecer mais sobre os efeitos psicológicos relacionados ao câncer de mama e buscar preveni-los?
Antes de ir direto aos aspectos psicológicos, vamos reforçar nossa realidade em relação aos dados estatísticos do câncer. O câncer de mama atinge mais de 2 milhões de pessoas todos os anos, no mundo todo. É o segundo tipo de câncer mais comum no Brasil, representando, atualmente, 30% dos casos novos de câncer em mulheres. É chocante! De acordo com o núcleo de estatísticas do Instituto Nacional do Câncer, a estimativa de novos casos é de 66.280 (2021-INCA), 18.295 acabam em morte, sendo 18.068 mulheres e 227 homens (2019 – Altas de Mortalidade por Câncer – SIM).
O câncer não é uma doença que surgiu na era moderna. Já existe desde 8000 a.C, e foi descoberto através do médico grego, Hipócrates de Cós, que, ao iniciar seus estudos, percebeu que o tumor era similar ao crustáceo caranguejo, e por isso, o nomeou de câncer, palavra que vem da origem Karkino (em latim), que significa caranguejo, em português.
Durante muitos séculos, o câncer era dado como uma sentença de morte e era considerado, também, como sendo contagioso e associado à falta de higiene, física e moral. Entendia-se que a doença poderia ser contagiosa através de práticas sexuais; dizia-se que a prática desencadeava a formação de nódulos cancerosos na cavidade bucal e trato digestivo, que se disseminava por todo o organismo (Bertolli Filho, 1996). Era considerado um castigo através do qual o doente poderia alcançar sua redenção, a libertação dos pecados, caso conseguisse suportar com resignação o sofrimento causado pela doença.
Nos anos de 1930 e 1940, ainda se via o câncer com essa demanda de cunho moral. No entanto, a partir daí foram incorporadas novas hipóteses advindas de observações da vida moderna e, então, outros fatores passaram a ser dados como seus causadores. Por exemplo, os alimentos industrializados, o fumo, o excesso de trabalho e o aumento de preocupações cotidianas. Desde os anos 50 até os anos 70, houve um longo caminho de descobertas e cada vez mais o câncer foi deixando de ser uma doença incurável, tornando-se curável.
Descobriu-se a necessidade de proporcionar boa qualidade de vida aos pacientes, admitindo questões de ordens psicológicas como agentes de melhorias. Desde então, psiquiatras, psicólogos e psicanalistas passaram a compor equipes de tratamentos oncológicos.
Com a descoberta dos fatores psíquicos no desenvolvimento do câncer, os tratamentos tornaram-se mais positivos, pacientes e familiares passaram a tratar de forma total o câncer, possibilitando cura e diminuição da doença. A questão moral das pessoas que se tornavam pacientes oncológicas não desaparece de uma hora para outra, mas passam a ser notadas de forma mais subjetiva, dando ênfase às questões da sexualidade em relação ao mundo interno de cada pessoa. Ou seja, se antes a doença era vista como uma consequência da conduta desregrada do indivíduo, cujos comportamentos e emoções eram desmedidos, agora a causa estaria relacionada justamente com a contenção do desejo ou não-expressividade das emoções.
Hoje em dia, a maioria das pessoas não conhece a história “social” do câncer e do câncer de mama, e não imagina que muito do que foi vivenciado durante os anos anteriores exerce influência, direta e indireta, em nossas condutas atuais. Somos resultado de uma soma. Por isso, ao falar do Outubro Rosa, aproveitamos para contar a história de forma global, pois isso nos faz entender melhor sobre preconceito, medo, impotência, vergonha, doença, dor psíquica e tratamento.
O câncer é uma doença multifatorial e atinge qualquer tipo de pessoa, independente de raça, credo ou classe social. Deve ser prevenida dentro de todos os fatores que podem ser de risco. De acordo com a teoria hipocrática, que também é conhecida como a doutrina dos quatro humores, a doença é resultado decorrente da perturbação do equilíbrio natural entre a mente, o corpo e o ambiente. Essa teoria, bastante antiga, já anunciava a necessidade de se tratar o todo para que o indivíduo não deixe o corpo vulnerável. Muitas outras teorias e estudos reforçam essa certeza observada durante séculos.
Desde os anos 70, onde se intensificou a atenção aos fatores psicológicos, entendemos que os aspectos mais identificados, desde a esfera psíquica, são os estados disfóricos (tristeza, depressão, abatimento, desânimo, desesperança, desamparo, desapontamento etc.), de ansiedade, assim como situações traumáticas que envolvem perdas e privações; as estruturas de personalidade também se tornam significativas no enfrentamento e tratamento da doença. Geralmente, pessoas marcadas pela passividade, pouca emotividade, baixa agressividade ou negação da hostilidade, são possíveis candidatos a desenvolver o câncer. Lutar contra o câncer implica exercer um comportamento ativo, agressivo, de valentia em relação à condição imposta, e para isso é necessário ter recursos psíquicos para enfrentá-lo..
As doenças psicossomáticas são desordens emocionais ou psiquiátricas que afetam também o funcionamento dos órgãos do corpo. Esses desajustes provocam múltiplas queixas físicas, que podem surgir em diferentes partes do corpo. O câncer é também conhecido como uma doença de ordem psicossomática em algumas pessoas.
Podemos prevenir e tratar o câncer de muitas maneiras, abrangendo as demandas físicas, mentais e ambientais. As recomendações médicas são destinadas ao corpo e, de acordo com o Instituto Nacional do Câncer (INCA), para prevenir a doença, são elas: praticar atividade física regularmente; alimentar-se de forma saudável; manter o peso corporal adequado, proporcional à altura; evitar o consumo excessivo de bebidas alcoólicas; realizar exames preventivos periodicamente; e evitar uso de hormônios sintéticos, como terapias de reposição hormonal. Dentre as recomendações de ordem psicológica estão: fazer terapia, conversar com familiares e amigos sobre o problema, pedir ajuda, prevenir, aceitar e encarar o diagnóstico de câncer, diminuir cargas estressoras, preocupações e conflitos, buscar ter bons relacionamentos amorosos e afetivos de forma geral, se manter saudável animicamente, ter lazer e estar em grupos de relacionamento interpessoal saudável.
Quero seguir, durante esse mês, conversando mais sobre o câncer, detalhando mais os feitios psicológicos que estão diretamente ligados ao câncer de mama, em mulheres, e falar do contexto familiar de pacientes oncológicos, em geral.
Prevenir é um ato de amor com você, com seu corpo e com todos que te amam.” Prevenção é se importar, se cuidar, se amar. Enfrente seus medos e desafie a vida. Que a sua coragem seja a primeira ferramenta para prevenir os diversos tipos de câncer que existem.