O perfil do consumidor que se organiza para viajar mudou?
Eliza Dinah, Jornalista- MG
eliza.dinah@mulheresjornalistas.com
Chefe de reportagem: Juliana Monaco, Jornalista
Editora Chefe: Letícia Fagundes, Jornalista
Viajar continua sendo uma das principais metas dos brasileiros: seja um passeio de fim de semana, férias em outro país, relaxar numa casa do interior ou visitar aquele parente que mora longe. A pandemia ajustou os planos que giram em torno das viagens, mas não as cancelou, em sua grande maioria. É o que aponta a segunda edição da pesquisa “O Novo Viajante”, realizada pela Interamerican Network e pelo Conselho de Turismo da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP).
A sondagem, feita com 833 respondentes do Brasil, do México, da Colômbia, do Chile, da Argentina e do Peru, indica que, independentemente do local a ser visitado, 34% dos entrevistados dizem que se sentem seguros para viajar. A maior preocupação dos brasileiros continua sendo com lugares que adotaram políticas de segurança sanitária, de saúde e de higienização (27%) e lugares sem aglomeração (27%), além de flexibilidade caso a pessoa decida alterar os planos e retornar para casa antes do tempo previsto (21,12%).
Além das questões que envolvem saúde, a pandemia também afetou a renda e o lado financeiro das famílias, por isso, o preço da viagem é a quarta maior preocupação, com 16%.
Oferta x Demanda
Empresas no ramo do turismo têm investido em pacotes de viagens que só acontecerão em 2022 ou até 2023. São diversas opções, com preços imbatíveis e datas flexíveis que atendem os dois lados da moeda: o do consumidor, que tem uma margem grande de período para se ajustar à viagem, e o da empresa, que negocia hospedagens e passagens a datas longínquas e garante um capital de giro para não fechar as portas.
Em estudo realizado em formato digital com mais de 1.300 brasileiros, sendo 61% mulheres e 39% homens, entre os dias 21 e 25 de julho, a Hibou, empresa de pesquisa e monitoramento de mercado, em parceria com a VPNY (Vou para New York), observou que 4 entre 10 brasileiros disseram que pretendem viajar até agosto de 2021 (37,8%). Já para 3 em cada 10 entrevistados, a vontade existe, mas não vão viajar (29,5%). Para 20,7%, as viagens ainda não estão decididas, e apenas 12% não querem e nem pretendem viajar tão cedo.
A questão por trás, que assusta os setores e os consumidores, é a imprecisão do cenário mundial diante da covid-19. “Ano passado, quando a pandemia começou, todo mundo imaginou que rapidinho ia passar, que alguns meses depois voltaria a normalidade. E aqui estamos um ano e meio depois. Imagina quem, naquela época, foi tão confiante e comprou pacotes que não poderão ser usados ou terão que ser adiados? A dor de cabeça que isso vira….”, reflete Larissa Martins, engenheira de Processos, de 26 anos.
O cenário confuso e imprevisível delimita, cada dia mais, dois perfis de consumidores distintos: de um lado, os que que aproveitam as promoções das empresas e querem viver o dia de hoje, sem ter medo do amanhã; do outro, os mais tradicionais, que não confiam em consumir viagens que ainda irão demorar para acontecer.
Esse segundo público é o caso da Larissa, que pontua: “Eu sou uma pessoa muito planejadora e eu me frusto muito se algo der errado. Acho que esse ano está pior que todos os outros anos, porque, além do quesito covid que vem sempre nos surpreendendo, pode acontecer várias outras coisas. Então, pessoas planejadoras e controladoras como eu acabam sofrendo a incerteza durante os meses de planejamento até chegar a data da viagem, sem saber ao certo se vão viajar ou não”.
A engenheira diz preferir comprar algo mais certo: viagens com antecedência de no máximo 3 meses, pois assim, segundo ela, se torna um processo que reduz as incertezas e a imprevisibilidade do que vai acontecer.
E não é só ela. Rozenilda Silva, aposentada de 61 anos, também tem acompanhado as intensas ofertas do setor, com preços tentadores. Segundo a aposentada, quem age no momento de impulso pelo desejo da viagem faz a compra. “As divulgações têm sido muito efetivas e oferecendo preços muito atraentes. A questão é que qualquer um está sujeito a contrair o vírus, até quem é vacinado tem a possibilidade de vir a ser infectado diante do aparecimento das novas variantes. Mesmo antes, diante da insegurança da própria doença, seria comprar um pacote de viagem sem se ter a garantia que você vai estar vivo até lá”, esclarece.
Rozenilda defende que, mesmo em um cenário comum de saúde, não há estabilidade nem em relação à questão financeira. “A pandemia mexeu diretamente na parte econômica, atingindo a questão dos empregos e, inclusive, até as empresas de turismo (hospedagens, companhias aéreas etc), que não sabemos se vão se sustentar diante da perda da arrecadação. Então, é um conjunto de coisas que torna extremamente arriscada a compra de uma passagem ou pacote turístico nesse momento. Não há garantias econômicas, nem sociais, nem de saúde”.
Já Gustavo Nepomuceno, analista financeiro de 21 anos, não pensou duas vezes antes de fazer algumas aquisições. O mineiro realizou, no fim de 2020, a compra de dois pacotes de viagens da empresa Hurb: um nacional, para Bonito por R$ 399, e outro internacional para o Peru, por R$ 999. “Estava muito barato, ninguém viaja para esses locais por esse valor. E acredito que promoções assim você tem de pegar a aproveitar, sem medo. Claro que todo cuidado é pouco, mas hoje em dia temos vários órgãos de proteção do consumidor. Então pensei que se desse certo seria perfeito, se desse errado, eu iria para o Procon reaver esse dinheiro”, comenta.
Gustavo iria realizar a viagem no primeiro semestre de 2021, mas por questão de segurança, resolveu adiar os planos. Mas nada que o desanimasse, pois os preparativos da viagem estão a todo vapor: “Eu estou super empolgado para ir. Para me cuidar e cuidar dos nossos, resolvi adiar, já que a empresa me deu essa possibilidade”. E não para por aí! Ele conta ainda que já está pensando em comprar mais dois roteiros: para Foz do Iguaçu e um outro destino internacional para 2023.
A publicitária Luiza Chrisostomo, de 26 anos, nunca saiu do Brasil, mas está prestes a realizar o sonho de infância: “Todo mundo tem aquele sonho de viajar, conhecer outra cultura, o velho sonho da Disney. E agora eu e minha mãe vamos poder concretizar tudo que a gente sonhou”. Ambas compraram um pacote internacional para Orlando, nos EUA, e já estão correndo atrás de passaporte, visto e outras burocracias para botar o pé na estrada.
Segundo Luiza, como a compra foi feita um ano atrás, o período para se organizar está sendo bem justo. Na época da compra, a data da viagem estava bem para frente, e isso nunca foi um problema para ela e a mãe. “Pelo contrário. Foi tempo suficiente para eu juntar o dinheiro e me organizar melhor. Eu troquei de emprego nesse meio tempo, e isso não vai ser um impeditivo já que a data é flexível. Foi uma decisão de caso pensado, e sem muita incerteza do dia do amanhã. Ninguém controla o dia do amanhã, e não dá para esse medo impedir a gente de se mover”.
Ela comemora ainda a condição que conseguiu adquirir o pacote. “Não é simplesmente o aéreo ou a hospedagem. O pacote vai me hospedar em um hotel 4 estrelas, dividir o quarto somente com minha mãe (é duplo) e por um valor incrível. Vai ser nossa primeira vez fora do país, e em qualquer outra circunstância isso não seria possível tão cedo. Então foi uma chance que eu agarrei” finaliza.
Perfil brasileiro
Ainda segundo o estudo realizado pela Hibou, em parceria com a VPNY (Vou para New York), a maioria dos brasileiros se programa com antecedência para que a viagem ocorra como gostaria, 37,9% se programam entre 3 e 6 meses antes, 23,8% um ano antes, 19,3% entre um e 3 meses, 12,2% um mês antes, 4,2% mais de um ano antes e 2,6% não gostam de viajar. O tempo de viagem ideal médio, segundo apontado pelo estudo, é de 11 dias, com máximo de 90 dias e mínimo de 4 dias.
Mesmo sendo o sonho de consumo de muitos hoje em dia, ainda existem preocupações inerentes a uma viagem no mundo atual e o que mais preocupa os brasileiros é o risco de contaminação (50%), seguido de problemas econômicos pessoais (33,5%), possibilidade de uma nova onda da covid-19 (32,3%), a não garantia da higiene dos transportes, manuseio das malas, aeroportos (21,2%), ou ainda, por conta da pandemia, encontrar pontos turísticos fechados (14%).
Além disso, 7 em cada 10 brasileiros não tinham viagens a desmarcar e apenas 1,5% dos entrevistados viajou conforme havia planejado durante a pandemia. Os demais se viram adiando (10,3%) ou desmarcando por completo (15,9%) seus planos no período.
Já quando o assunto é a volta da normalidade, os horizontes estão mais distantes que o desejo. Apesar do volume em torno da virada do ano, 27% dos respondentes brasileiros acreditam que as viagens nacionais só devem se normalizar após julho de 2021, e este número sobe para 39% falando das viagens internacionais.