Por Sara Café, jornalista
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Diretora de jornalismo: Letícia Fagundes, jornalista

 

Temos visto um aumento significativo na presença feminina no mundo dos negócios e no empreendedorismo, sendo um catalisador de mudanças profundas no ambiente corporativo, impulsionando a inovação, a sustentabilidade e um equilíbrio estratégico nas decisões empresariais

Na sexta-feira passada, foi comemorado o 8 de março, Dia Internacional da Mulher. Especialmente nessa data, todos se mobilizam para conversar sobre essa agenda tão relevante e celebrar as conquistas e os desafios das mulheres que lutam por seus direitos, sua voz e seu espaço na sociedade. Com a mudança do perfil em cargos corporativos, a ascensão da liderança feminina nos negócios representa não apenas uma evolução social significativa neste contexto, mas também uma estratégia vital para promover a diversidade e impulsionar o sucesso organizacional.

Talita Matos, fundadora e CEO da Singuê | Imagem: Divulgação

“A presença de mulheres em cargos de liderança contribui para a quebra de estereótipos de gênero e promove um ambiente de trabalho mais igualitário, diverso e inclusivo. Além disso, a diversidade de perspectivas, as suas experiências e habilidades enriquecem as tomadas de decisão e impulsionam a inovação”, avalia Talita Matos, cientista social, fundadora e CEO da Singuê.

Além disso, capacitar empresas para a implementação de práticas e condutas que visem à igualdade de gênero está em consonância com o Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS 5) e ESG (sigla em inglês para meio ambiente, social e governança), ponto importante para o período dinâmico pelo qual o mercado corporativo está passando, influenciado pela transformação digital e o futuro do trabalho. 

“O capital humano é fundamental para o crescimento econômico dos negócios e o talento feminino faz parte disso. Tornar o ambiente mais saudável com iniciativas para que mulheres permaneçam no mercado de trabalho é necessário. Além de atrair talentos, é preciso mantê-los; por isso, pensar e desenvolver políticas com jornadas flexíveis e ações que envolvam a parentalidade são importantes”, destaca Patrícia Lima, Diretora de Bens de Consumo da Elgin. 

O Pacto Global, maior iniciativa mundial em sustentabilidade, também promove a igualdade de gênero como um de seus compromissos. Com relação aos cargos de liderança, a meta é ter 30% de mulheres em altos postos até 2025 e 50% de representatividade feminina nessas posições até 2030.

No rumo da transformação

Patricia Lima, Diretora de Bens de Consumo da Elgin | Imagem: Divulgação

Apesar dos avanços, as mulheres ainda lutam pela equidade salarial e pelas mesmas oportunidades em cargos de liderança e gestão no mercado de trabalho. Segundo a pesquisa “Mulheres no Mercado de Trabalho em 2023″, da Mckinsey em parceria com a LeanIn.Org, nove em cada dez mulheres com menos de 30 anos buscam promoções dentro de suas áreas, dessas, 3 em cada 4 aspiram a cargos de liderança. Ainda assim, em 2023, a representação de mulheres em cargos de liderança executiva foi, somente, de 28%, de acordo com dados do mesmo relatório.

Um estudo recente do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) revelou que cerca de 40% das pessoas ainda acreditam que os homens são melhores executivos do que as mulheres. Este cenário desafiador é agravado pela persistência de estereótipos e preconceitos no mercado de trabalho.

Para a CEO da Singuê, Talita Matos, a cultura historicamente masculina das empresas, a sobrecarga de tarefas e o preconceito em relação às mulheres em cargos de comando e alta gestão são alguns dos desafios a serem vencidos. “O problema é que essa lógica é regida por padrões e visões de mundo masculinas e modos de funcionamento feitos por e para os homens. As empresas devem estar abertas para transformações culturais profundas que considerem experiências mais plurais, não apenas de mulheres, mas de pessoas que também são mães, negras, PCDs, periféricas e com diferentes bagagens pessoais e históricas”.

A pesquisa do Insper evidencia um certo avanço nos indicadores. De 2017 a 2023, a presença feminina nos conselhos administrativos aumentou de 10% para 21%. No que diz respeito aos cargos de CEO, o crescimento é ainda mais expressivo, passando de 8% para 17%. No entanto, um levantamento da ONU Mulheres mostra que o acesso desigual de homens e mulheres às inovações digitais fez com que seja perdido US$ 1 trilhão ao Produto Interno Bruto (PIB) em países de baixa e média renda, entre 2013 e 2023. Ainda segundo a organização, esses mesmos prejuízos financeiros podem chegar a US$ 1,3 trilhão até 2025.

Sabrina Capozzi, Diretora e Sócia da FutureBrand São Paulo | Imagem: Divulgação

Para Sabrina Capozzi, Diretora e Sócia da FutureBrand São Paulo, um dos principais desafios da liderança feminina é a habilidade de articular e influenciar pessoas. Ela enfatiza seu papel como agente de mudança, promovendo a inovação, mas reconhece que as organizações muitas vezes resistem ao novo. “As marcas acabam preferindo manter-se em uma zona de conforto, em um cenário já conhecido, exigindo um maior esforço e dedicação para mudança dessa percepção”, explica. Para ela, a autocompaixão ao longo da jornada de evolução, tanto no âmbito profissional quanto pessoal, é essencial.

A executiva Juliana Vital, Global Chief Revenue Officer da Nubimetrics no Brasil, plataforma que empodera os vendedores e grandes marcas com dados inteligentes, atua há 20 anos em negócios digitais, SaaS e E-commerce, áreas majoritariamente masculinas. Ela destaca que, por uma questão estrutural da sociedade, o mercado de trabalho tende a colocar um caminho mais difícil para as mulheres. 

“Primeiramente, precisamos que os brasileiros estejam empenhados na solução desse problema, principalmente os homens devem assumir a responsabilidade como parte da mudança. Nos últimos dez anos ocupando cargos de liderança, por diversas vezes fui a única mulher em reuniões de diretoria, sempre aproveito os momentos para colocar o assunto em pauta e propor uma mudança de perspectiva.”

Quando a empresária também é mãe fica ainda mais difícil conciliar as funções. “Há batalhas diárias que as mulheres ainda precisam lutar, como a questão da maternidade: é como se a mulher precisasse escolher entre ser mãe ou ser uma executiva ou empreendedora. Ainda vivemos em uma sociedade que sustenta e alimenta mecanismos de exclusão”, comenta Daniele Amaro, cofundadora da Paytrack. 

Daniele Amaro, cofundadora da Paytrack | Imagem: Divulgação

Empreendedorismo periférico e feito por mulheres

Mais que uma estratégia de sobrevivência, o empreendedorismo social feminino prospera e fortalece as periferias do Brasil. A despeito de qualquer perspectiva de apoio e de investimentos, as mulheres estão transformando escassez em abundância de soluções criativas que servem aos territórios e às pessoas em situação de vulnerabilidade social e econômica.

Um desses exemplos é o Social Lab, programa de incubação de negócios de impacto socioambiental periféricos em Fortaleza (CE), que teve seu encerramento na última quinta-feira de fevereiro (29/02).

Desenvolvido pelo Social Brasilis em parceria estratégica com a Coalizão pelo Impacto, o programa é voltado para empreendedores e empreendedoras que tem uma ideia de negócio de impacto socioambiental e querem tirá-la do papel ou já tem um negócio de impacto socioambiental em estágio inicial e querem expandir ou fortalecer a sua iniciativa.

“Será que as nossas populações da base da pirâmide que tem defasagens educacionais e falta de letramento digital estão sendo incluídas nos novos modelos de negócios? Queremos atingir coletivos que busquem desenvolver sustentabilidade financeira e que contribuam para a resolução de um problema social”, observa Manu Oliveira, fundadora e diretora-executiva do Social Brasilis.

Manu Oliveira, fundadora do Social Brasilis | Imagem: Sara Café

Segundo dados da organização, foram 88 inscrições para o programa de incubação e 64% representam as mulheres, do público feminino inscrito 100% são mulheres periféricas. Destas mulheres inscritas, 73% são pretas e pardas, e dos 11 negócios sociais aprovados no Social Lab, 8 são lideranças femininas. Dos 8 negócios sociais na reta final da incubação, 5 são liderados por mulheres. 

“Finalizamos a incubação Social Lab com uma grande representatividade de mulheres empreendedoras das periferias e favelas de Fortaleza e isso nos mostra muita relevância. Apoiar mulheres no desenvolvimento de atividades empreendedoras aumenta a geração de trabalho e renda, fortalece a autonomia financeira e a autoestima”, completa. 

Além de contribuir para o desenvolvimento local, gerando renda, emprego, qualificação, inovação e soluções para problemas sociais e ambientais, os negócios de impacto na periferia fortalecem a identidade, a cultura, a autoestima, promovendo a inclusão, a participação e a transformação social. “Através da incubação, também passamos a trabalhar a pessoa, incentivando a criação de redes de apoio entre as participantes e também criando momentos de terapia coletiva através do incentivo à formação de grupos produtivos de empreendedoras e artesãs”, comemora Manu Oliveira. 

 

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