Jornalismo comunitário gera impacto amplificando voz da população
Por Raquel Banus, jornalista
E-mail: raquel.banus@mulheresjornalistas.com
Chefe de reportagem: Juliana Monaco, jornalista
Diretora de jornalismo: Letícia Fagundes, jornalista
Iniciativas como o Jornal Maré de Notícias contribuem para ampliar a cidadania, trazendo os moradores para o centro dos debates acerca dos seus direitos
O Brasil é um dos países com maior concentração dos meios de comunicação, onde os veículos com maior audiência são controlados por um pequeno número de grupos midiáticos, de acordo com a pesquisa realizada pelo Monitoramento da Propriedade de Mídia (Media Ownership Monitor).
Uma das consequências desse monopólio é a anulação da diversidade de ideias e narrativas, por meio do interesse comercial das empresas que controlam a comunicação no país. Diante dessa realidade, alternativas como o jornalismo independente se tornam imprescindíveis na garantia do direito à informação, quebrando paradigmas e se tornando ferramenta de transformação social.
Um exemplo de jornalismo independente que busca informar e desmistificar, dando voz e vez ao cidadão no processo de produção de notícias, é a comunicação comunitária.
Comunicação Comunitária
Realizada pela comunidade, a comunicação comunitária vai além de informar, estimulando os moradores a analisar e buscar soluções para os problemas cotidianos de sua comunidade. Ela reforça interesses comuns da população como a divulgação de campanhas de saúde, projetos sociais, iniciativas inspiradoras, ajuda o morador a se manter informado sobre seus direitos como cidadão, reforçando o sentimento de pertencimento aquele espaço. Dessa forma, ela se estrutura como ferramenta imprescindível na luta pela inclusão social, especialmente em locais mais negligenciados pelo poder público e que são representados nos veículos da grande mídia de forma preconceituosa e estereotipada.
Maré de notícias
No Rio de Janeiro, um exemplo dessa iniciativa é o Jornal Maré de Notícias, criado no ano de 2009 pela ONG Redes da Maré. Localizado dentro do complexo que agrupa 16 comunidades, o jornal produz conteúdo que informa e mobiliza o morador através de seu potencial e protagonismo,
incentivando ações que contribuem para a qualidade de vida dos mais de 140 mil moradores. O jornal aborda pautas relacionadas à saúde, meio ambiente, mobilidade urbana, direitos humanos, segurança pública e economia.
Uma das histórias que o jornal abordou e ganhou grande repercussão foi a do morador Adriano Álvaro de Melo, de apenas 7 anos. Diagnosticado com altas habilidades, Álvaro desenvolveu um jogo em inglês após concluir um curso de programação na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos. Sua participação ocorreu através de um programa de Assistência Financeira, que oferece a possibilidade de isenção do valor do curso através da comprovação da condição financeira da família.
Sobre a atuação do jornal na desmistificação de representações negativas relacionados à comunidade, a coordenadora do jornal Jéssica Pires enfatiza:
“Moramos aqui e abordamos a comunidade sobre uma lógica que escolhe ver a natureza das coisas, não estamos negligenciando nenhum problema. Estamos contando também histórias verdadeiras de pessoas que constroem suas vidas e suas trajetórias, constroem coisas muito especiais que ocorrem tanto aqui quanto em qualquer outro espaço, coisas que são cotidianas mas também muito especiais.”
No decorrer da entrevista, Jéssica esclarece que complexos como a Maré são consequência de uma lógica de pensamento da cidade e há a escolha de grandes veículos de comunicação de seguir abordando a comunidade somente quando o tema é violência, ausência e dificuldade.
Nesse cenário, iniciativas como o Maré de Notícias seguem como ferramentas imprescindíveis na luta por interesses de quem está inserido no mesmo contexto social e cultural e na ampliação da cidadania, trazendo o morador para um espaço onde se debatem temas fundamentais para a comunidade em que vivem.
Dados do censo realizado pelo Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo (Projor) evidenciaram uma redução de 8,6% no número de cidades sem veículos locais de imprensa independente no Brasil. Esses dados comprovam uma mudança positiva, porém continua sendo essencial a criação de políticas de incentivo que estimulem o surgimento e a manutenção de novos meios alternativos de comunicação, fortalecendo iniciativas locais. Políticas que favoreçam a diversidade, garantindo a luta da população por seus direitos e a compreensão dos fatos de forma mais plural, sobretudo em locais onde a população é representada de forma marginalizada, garantindo o direito à informação e protegendo nossa democracia.
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