Por Sara Café, jornalista
Chefe de reportagem: Juliana Monaco, jornalista
Diretora de jornalismo: Letícia Fagundes, jornalista

O ano de 2023 foi marcado pelo crescimento exponencial de ataques cibernéticos, e este ano será ainda mais desafiador na proteção de dados pessoais e operações corporativas, principalmente devido às eleições municipais. 

Um crime virtual é considerado todo e qualquer ato criminoso que é realizado dentro de um ambiente virtual. Podem variar muito, indo desde roubos e furtos até mesmo ameaças, chantagens, divulgação de dados privados, espionagem cibernética, vendas ilegais, violação de direitos autorais, fraude de identidade, entre muitos outros.

“O brasileiro é um povo que adota muito rapidamente as novas tecnologias. Isso tem um lado positivo, mostra que é um povo mais tecnológico e mais aberto. Mas, por outro lado, obviamente, você tem essa fragilidade que acaba cometendo toda a população”, explica Ricardo Saponara, líder em prevenção contra fraudes no Software de Analytics & Soluções (SAS).

Os brasileiros estão sofrendo cada vez mais tentativas de fraude de identidade. De acordo com Indicador de Tentativas de Fraude da Serasa Experian, os cidadãos do país foram submetidos a quase 4 milhões de tentativas de fraude de identidade em 2022. Isso representa uma vítima a cada 9 segundos. Embora haja uma queda de 7,3% em relação ao ano anterior, o número ainda é preocupante.

A média global de ataques cibernéticos contra organizações teve um crescimento de 7% no primeiro trimestre de 2023, quando comparado com o mesmo período no ano anterior, segundo uma pesquisa da Check Point Research (CPR). Enquanto cada organização recebeu 1.248 ataques semanais neste ano, os dados apontavam aproximadamente 1.160 investidas digitais entre janeiro e março de 2022.

“Os fraudadores e os criminosos estão ávidos por conseguir identificar novas brechas, novas situações, enquanto o povo está querendo efetivamente acessar e abraçar esse ambiente”, completa Saponara. 

Como prevenir e detectar crimes virtuais 

O relatório de Defesa Digital da Microsoft de 2023 revela a importância de práticas de segurança para mitigar até 99% dos ataques cibernéticos. Estes são os ataques de identidade (42%) abrangendo roubo de credenciais e acesso não autorizado a contas; tentativas de phishing (25%), onde se enganam usuários para que revelem informações confidenciais como senhas ou dados bancários; e comprometimento de e-mails corporativos (4%), em que criminosos se passam por funcionários ou parceiros de negócios para obter acesso a informações confidenciais ou realizar transferências fraudulentas.

As principais estratégias para prevenir e detectar fraudes cibernéticas são:

  1. Autenticação Multifator para fortalecer a resiliência de identidade. Ao exigir múltiplas formas de verificação, as organizações podem se proteger contra o uso indevido de credenciais comprometidas, um vetor comum de ataques;
  2. Princípios Zero Trust sugerem a verificação contínua de todos os usuários e dispositivos, concedem acesso mínimo necessário, operam sob a premissa de violação potencial e ajudam a criar uma barreira robusta contra ataques;
  3. Softwares XDR e antimalware facilitam a detecção e bloqueio de ataques e permitem uma resposta rápida e eficaz às ameaças emergentes;
  4. Atualizações regulares dos sistemas operacionais e firmwares que são cruciais para mitigar riscos relacionados às vulnerabilidades conhecidas.

“Os vestígios digitais são considerados evidências cruciais e, assim como qualquer prova, sua preservação desde a cena do crime até a apreensão deve seguir as etapas da cadeia de custódia delineadas no Código de Processo Penal. Essas etapas incluem o reconhecimento, isolamento, fixação, acondicionamento, transporte, recebimento, armazenamento e descarte”, esclarece Marivaldo Pires, advogado especialista em crimes virtuais. 

Crimes cibernéticos e eleições municipais

O processo eleitoral brasileiro deve enfrentar, em 2024, uma das maiores provas de fogo graças à popularização das ferramentas de Inteligência Artificial (IA). A Lei nº 9.504/1997, que estabelece normas para as eleições, incluindo propaganda eleitoral na internet, reconhece esse cenário ao permitir a utilização das redes sociais como ferramentas poderosas de engajamento eleitoral. 

Imagem gerada por Inteligência Artificial/Midjourney

Essa legislação define regras para a veiculação de propaganda eleitoral online, como a identificação de conteúdo patrocinado e a proibição de impulsionamento por pessoas jurídicas, conforme previsto no artigo 57-A e artigo 57-C do Código Eleitoral Brasileiro.

O Google já anunciou que não permitirá a veiculação de anúncios políticos durante as eleições municipais de 2024 no Brasil. A decisão foi tomada em resposta às novas regras para propaganda eleitoral estabelecidas pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) em fevereiro. Em comunicado, a gigante da tecnologia revelou que essa atualização entrará em vigor em maio, em consonância com as resoluções eleitorais para 2024. “Temos o compromisso global de apoiar a integridade das eleições e continuaremos a dialogar com autoridades em relação a este assunto”, disse a empresa. 

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, participou na quarta-feira (03/04), da assinatura do acordo de cooperação técnica do Centro Integrado de Enfrentamento à Desinformação e Defesa da Democracia (Ciedde), com a Polícia Federal e a Advocacia-Geral da União (AGU). O Ciedde tem o objetivo de auxiliar na atuação coordenada da Justiça Eleitoral, junto aos órgãos da República, instituições públicas e privadas; na promoção da cidadania, valores democráticos e direitos digitais, além de combater a desinformação e os discursos de ódio e antidemocráticos, no âmbito eleitoral.

A divulgação de fake news costuma tomar grandes proporções durante as eleições. O Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MG) e o Ministério Público (MPMG), por exemplo, miram principalmente nas “deepfakes”, instrumento capaz de manipular áudios e vídeos e de criar conteúdos falsos altamente realistas, o que, na avaliação de especialistas, eleva a produção de fake news a outro patamar. 

“Todos os cidadãos devem lutar para que a melhor informação possível seja difundida e não as mentiras que tanto prejudicam o processo democrático. Nesse sentido, a responsabilidade dos políticos eleitos é ainda maior, afinal de contas, eles gozam da respeitabilidade e servem de exemplo para muitos eleitores”, afirma  o professor Jaime Barreiros, doutor em Ciências Sociais e analista judiciário do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia (TRE-BA). 

Em fevereiro deste ano, o TSE regulamentou, de maneira inédita, o uso da Inteligência Artificial (IA) na propaganda de partidos, coligações, federações partidárias, candidatas e candidatos nas Eleições Municipais de 2024. Conforme aprovado, a inteligência artificial só poderá ser usada na propaganda eleitoral, em qualquer modalidade, com um aviso explícito de que o conteúdo foi gerado por meio de IA.

“Esse aperfeiçoamento da IA, com alto grau de manipulação, e o alcance desse tipo de conteúdo principalmente em regiões onde não se tem a cultura de checar informações é extremamente preocupante”, alerta Isabella Damasceno, presidente da Comissão de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Minas. 

Diante desse cenário, é necessário um esforço conjunto entre legisladores, autoridades eleitorais, plataformas de redes sociais e sociedade civil para promover um ambiente digital mais saudável e democrático. 

Isso pode envolver aprimoramentos na legislação existente, a implementação de tecnologias de verificação de fatos mais robustas e a conscientização dos usuários sobre os riscos da desinformação. Ao mesmo tempo, é fundamental garantir que as medidas adotadas respeitem os princípios fundamentais da liberdade de expressão e do direito à informação.

Projeto prevê medidas para fortalecer investigação de crimes cibernéticos

O Projeto de Lei 537/24 prevê que a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS) inclua, entre seus objetivos, medidas para fortalecer a prevenção, investigação e repressão aos crimes cibernéticos, especialmente os que tenham repercussões sociais violentas. A proposta está em análise na Câmara dos Deputados.

O texto determina ainda que o Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP) deverá incluir entre os critérios de aplicação dos recursos as metas e os resultados relativos à prevenção, investigação e repressão aos crimes cibernéticos com repercussões sociais violentas.

“O fortalecimento da atividade de inteligência policial, conforme proposto, é uma resposta necessária e adequada às ameaças contemporâneas impostas por criminosos que utilizam a internet para fomentar e organizar violência no mundo real”, explica o deputado Rodrigo Gambale (Podemos-SP), autor do projeto.

LEIA TAMBÉM:

Tecnologias na saúde pública: importância e principais avanços

TV MJ; O que esperar para o Brasil em 2024?

Entrevista exclusiva: Um nordestino criador do Instituto Tecnológico de Aeronáutica