Por Adriana Buarque, jornalista
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Chefe de reportagem: Juliana Monaco, jornalista

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, suspendeu no dia 17 o acordo do país com a ONU e a Turquia que liberou a exportação de cereais da Ucrânia nos últimos 12 meses a partir dos portos do Mar Negro. A decisão afeta o comércio mundial de commodities agrícolas no qual o Brasil tem participação significativa, sendo esperado um aumento de preço dos alimentos em escala global nos próximos meses.

Na quarta-feira, 26, a chefe do Novo Banco do Desenvolvimento (o banco dos Brics), a ex-presidente Dilma Rousseff, se encontrou com Putin e o dirigente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, na véspera da reunião de cúpula dos líderes Rússia-África. De acordo com o comunicado oficial à imprensa, a instituição não vai ajudar a Rússia a fazer frente às sanções ocidentais. Quanto à cúpula propriamente dita, os governos africanos buscam superar a insatisfação com o governante russo devido à saída do acordo de grãos.

A política expansionista de Putin atesta que o xadrez geopolítico atingirá a todos cedo ou tarde. Em agosto, ocorrerá a reunião dos Brics em que ele participará por videoconferência e será representado presencialmente pelo chanceler Sergei Lavrov. Caso o líder russo compareça, deve cumprir o mandado de prisão emitido pelo Tribunal Penal Internacional por crimes de guerra, o que será um grande constrangimento para o chefe de Estado.

Se a desigualdade social cria um fosso que aumenta dia após dia, a fome resultante desse abismo tende a se propagar numa velocidade difícil de controlar, levando mais pessoas para uma vala comum de escassez alimentar. Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, o Brasil ocupa o 94º lugar no mapa da fome. O progresso na redução da desnutrição foi observado na Ásia e na América Latina, mas ainda cresce na Ásia Ocidental no Caribe e em todas as sub-regiões da África em 2022. Continente fragmentado por guerras civis, não é de agora que a população africana sofre com a desnutrição.

Mas quem decide quem vai comer o quê? O geógrafo Milton Santos ressalta que a questão da fome não é a produção, mas a distribuição dos alimentos. Segundo o acadêmico, a globalização apresenta três faces: o mundo como nos fazem ver, tal qual ele é e como pode ser.  Quem estiver em São Paulo pode visitar a exposição no Itaú Cultural sobre a trajetória daquele que é considerado um dos maiores intelectuais do Brasil no século XX.

Interessantes os contrastes observados e que são considerados tendência como a gourmetização do essencial. O Prato Feito brasileiro, velho conhecido composto por arroz, feijão, bife, batata e ovo, pode variar entre R$ 10 e R$ 56. Em pesquisa realizada no ano passado pela Associação Brasileira do Consumidor, dependendo da região a maior variação pode chegar a 460%. Os impostos sobre os itens que compõem a cesta básica devem sofrer alterações com a reforma tributária, uma vez que o governo federal e o Congresso estudam uma lista nacional única de artigos.

De ovas de caviar a um polêmico churrasco de ouro, passando por um simples hambúrguer ou até mesmo uma sopa, cada um manifesta seu paladar dentro das próprias condições quando vai a um restaurante. Por outro lado, em 2023, a alimentação no domicílio pode registrar uma deflação pela primeira vez em seis anos. Com a queda nos preços de produtos in natura e carnes, além da relativa normalização no mercado de trigo e super safra brasileira de soja, alguns economistas ponderam que a inflação dos alimentos deve ser historicamente baixa.

E num país tão diverso como o Brasil, a questão do agronegócio esbarra nos embates entre fazendeiros e o MST. Os conflitos evidenciam uma raiz ligada a crenças religiosas que desemboca não apenas na divisão de terra, mas também na polarização política.

As decisões feitas pelos governos do hemisfério norte desembocam em cascata no hemisfério sul, correlacionando o meio-ambiente e a economia mundial. As civilizações antigas calculavam o tempo baseadas no calendário lunar para realizar a colheita de suas plantações. Quais são atualmente os reais marcadores do relógio da política global?

Se existe algum.