Por Ana Luiza Timm Soares
Diretora de jornalismo: Letícia Fagundes, Jornalista
Chefe de reportagem: Juliana Monaco, Jornalista
Editora de conteúdo – Site MJ: Beatriz Azevedo, Jornalista

 

*Peço licença para falar de outro tema que não moda/vestuário, mas é que tem um negócio engasgado aqui. 

A trágica morte da cantora Marília Mendonça e o desrespeito às mulheres até em momentos de dor foram pauta de vários (as) veículos de informação ao longo desta semana. Muito se falou sobre o texto publicado pela Folha de São Paulo, onde o colunista Gustavo Alonso tece comentários acerca da aparência física da artista. Luciano Huck também causou indignação ao falar sobre o peso da mesma e das também cantoras Maiara e Maraisa em rede nacional. 

Como se não bastasse tamanho disparate, o site Terra Brasil ainda aproveitou a deixa para chamar a mãe enlutada de “idosa” ao noticiar que “dona” Ruth Moreira passou mal ao saber da morte da filha – a mãe de Marília Mendonça tem apenas 53 anos de idade. 

Obviamente este tipo de comentário absolutamente descabido acerca dos corpos femininos é marca do machismo arraigado em nossa sociedade, já que o mesmo não ocorre com artistas homens que se encontram fora do padrão estético. Ou vocês já leram algo como “apesar dos quilinhos a mais, César Menotti e Fabiano não sabem o que é fracasso”, ou “embora seu visual não fosse atraente para o mercado, Tim Maia conquistou o Brasil com sua voz”…

Ficamos indignadas – e com razão – quando nos deparamos com estas “opiniões”, geralmente proferidas por homens (mas não só), que não respeitam nem o luto de todo um país. Mas já paraste para pensar que, mesmo com uma roupagem “positiva”, o corpo das mulheres é sempre pauta de discussão?

Quantos foram os textos direcionados à carreira da cantora, quando em vida, que não mencionaram seus “quilinhos a mais” ou seu processo de emagrecimento? Qual a necessidade de sempre impor um discurso nesse sentido? A trajetória de Marília e de tantas outras mulheres precisa mesmo estar atrelada à sua forma física?

É claro que podemos mencionar o fato de que estas pessoas inspiram milhares de outras mulheres e meninas mundo afora e falar sobre representatividade (e tantos outros temas importantes à transformação de uma sociedade gordofóbica, machista e racista), é necessário. Mas sinceramente, me incomoda o fato de sempre PRECISARMOS citar isso. 

“Com 15 quilos a menos e puro talento, a principal voz do Feminejo faz público vibrar em São Paulo”. “Dona de uma voz impecável e alguns quilinhos a mais, a sempre linda e talentosa…” Até quando nossos corpos serão notícia? Por que precisamos ser lindas e/ou magras – na maioria das vezes tratado como sinônimos – para falar sobre nosso trabalho e conquistas? Por que não podemos simplesmente mostrar ao mundo nosso talento sem reiteradamente dissertar sobre nossa forma física?

Quando nos deparamos com uma tragédia como esta os sentimentos ficam à flor da pele e percebemos de forma mais clara os absurdos da sociedade patriarcal, mas não podemos perder a capacidade de nos indignar em outras épocas. 

Ao falar de Marília Mendonça (e de outras mulheres do meio artístico), que tal lembrar que a cantora lançou música denunciando a violência doméstica contra mulheres? Que ela, junto a outras artistas de sua geração, desbravou com sucesso um caminho majoritariamente masculino? E quem sabe lembrar dos prêmios recebidos? 

O legado de Marília fala por si. E ele não se impôs “apesar de” nada. É talento e trabalho mesmo. Parem de nos justificar. Apenas nos respeitem.