Por Mariana Mendes, Jornalista –SP
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Milla Garcia é uma das mulheres que representam o atual cenário da locução esportiva

             A televisão brasileira vive um momento histórico no mundo esportivo. Ao trocar de canais para assistir um jogo de futebol, basquete, e-sports ou até nas Olimpíadas, é possível encontrar uma mulher narrando e/ou comentando, e não apenas nos eventos como Campeonato Brasileiro de Futebol Feminino, com narrações de Isabelly Morais e comentários de Alline Calandrini e Milene Domingues. A NBA, um dos maiores torneios do esporte e do basquete, tem participação da narradora Natália Laura.

Seja na ESPN, na Globo, no SporTV ou em serviços de streaming como DAZN e TV NSports, você pode encontrá-las. Uma das mulheres que tem um pezinho em diversos canais é Camilla Garcia. Milla, como é conhecida, narrou o primeiro campeonato de PES exclusivo para mulheres, e, hoje, participa do time de narradores do Brasileirão Série C e outros eventos da CBF TV.

Para entender como o campo da narração abre espaço cada vez mais para uma representatividade justa às mulheres, o Instituto Mulheres Jornalistas conversou com Milla sobre sua jornada profissional. Hoje, com 35 anos, é locutora esportiva, mas sua formação não reflete isso.

Como tudo começou

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Foto: Reprodução/Instagram/ @narradoramilla

Milla tem no seu currículo a formação em música, com habilitação em violão. Dava aulas para crianças e adolescentes de até 14 anos, desde do fim da faculdade, e foi quase por acaso que tudo mudou. Em fevereiro de 2018, estava em casa assistindo uma partida da fase de mata-mata da Champions League entre Real Madrid e PSG. Durante a partida, o narrador do Esporte Interativo anunciou um reality show chamado “A Narradora Lays”, que iria dar a oportunidade para uma mulher participar da locução de um jogo do maior campeonato europeu.

Sem pensar duas vezes, Milla se inscreveu. “Eu estava em casa assistindo ao jogo e, por ser apaixonada por futebol, resolvi me inscrever. Nunca tinha narrado na vida e foi assim que tive o primeiro contato; primeiro no vídeo de inscrição, que precisava enviar um lance narrado, e depois durante o programa fui aprendendo como narrar diversos esportes”, conta. Milla ficou em quinto na competição e não parou de se dedicar à narração esportiva desde então.

Sempre apaixonada por esporte, Milla nunca sonhou em trabalhar com esse ramo. “A primeira lembrança que tenho da vida é a de estar brincando de bola na rua. Lembro muito de quando era bem pequena e ainda morava na cidade que nasci, Fortaleza, e chutava tudo que via pela frente. Sempre joguei futebol, na rua, em escolinha, em times. Já disputei o campeonato Baiano, inclusive. Sempre assisti bastante e, além do futebol nacional, gosto de futebol internacional.”

Após o final do programa do Esporte Interativo, ela decidiu se mudar para São Paulo em busca do sonho. “Vim na cara e na coragem”, diz. Para se sustentar, chegou a arrumar trabalho como professora de música, mas sempre junto com as narrações. E foi nessa correria que surgiu outro reality show, agora de e-sports do SporTV. O “Looking for a Caster” daria oportunidade para o vencedor participar da narração da final do Brasileirão de Rainbow Six Siege, um jogo de tiro tático.

O machismo ainda presente no esporte

            Nesta competição, Milla ficou em primeiro lugar. “Quando venci, houve muitos ataques dizendo que eu venci só porque era mulher. Esse foi um momento complicado, mas nada me abateu ou me fez cogitar parar e desistir. Devido a esses ataques, foi criado o movimento #porqueémulher, uma campanha linda que passava nos canais Globo e repudiava os ataques e o machismo depois da vitória no programa. Diziam que venci porque era guerreira, porque era forte e tantas outras coisas, não porque era mulher. Me senti muito acolhida e protegida. Segui mais forte ainda e continuei trabalhando”, relembra.

“O desafio maior no início é lidar com o machismo que sempre quer impedir que as mulheres façam alguma coisa. A luta é grande, mas vamos continuar insistindo e lutando por esse espaço”, Milla expressa os obstáculos enfrentados no mundo esportivo. Ainda assim, é admirável ver a paixão da locutora pela profissão.  “Narrar é contar grandes histórias, então sempre me sinto muito feliz por contá-las, independente de modalidade”.

Ao tratar de sonhos profissionais, Milla inspira outras mulheres e fala na importância de ter referências femininas em diversas áreas. “O maior sonho é continuar narrando sonhos, continuar contando grandes histórias, com muito carinho, dedicação e paixão. Falando em um campeonato específico, gosto muito de Copa do Mundo e Champions League. Espero continuar fazendo o que amo, esse sem dúvida é o meu maior objetivo todos os dias.”

“Desejo muito também que muitas outras meninas sonhem um dia em serem narradoras. Que não cresçam como nós, sem referência feminina nas transmissões esportivas. Que a narração feminina seja encarada como algo mais natural e cada vez mais comum. Que possamos dividir melhor esse espaço.”, conclui.