Por Giselle Cunha, Jornalista- RJ
giselle.cunha@mulheresjornalistas.com
Diretora de jornalismo: Letícia Fagundes, Jornalista
Chefe de reportagem: Juliana Monaco, Jornalista 
Editora de conteúdo – Site MJ: Beatriz Azevedo, Jornalista

Meios que preservam nosso planeta, sem impactar na produção e na economia do país

Há quase 50 anos, ocorria em Estocolmo, na Suécia, a Primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento. O evento foi marcado como o início do conceito da sustentabilidade. Essa definição é constituída por três pilares fundamentais: social, econômica e ambiental.

Praticar a sustentabilidade é utilizar recursos e promover ações no agora, que não irão impactar ou prejudicar a natureza ou todo o ecossistema para as gerações futuras. É a busca pelo equilíbrio e respeito com o nosso planeta. A inclusão desse tema nas escolas, muitas vezes, é o primeiro estágio de conscientização de uma criança sobre o assunto e é considerado um importante passo que necessita cada vez mais de investimento e incentivo para que, na fase adulta, existam pessoas organicamente engajadas e responsáveis com o meio ambiente.

De cara com a crise

A pandemia trouxe transtornos para o setor, pois o fechamento das fronteiras o deixou impossibilitado de permanecer com a entrega por um período dos insumos utilizados nas produções, e a alta do dólar também atingiu diretamente materiais básicos utilizados. Outro desafio se deu devido à exposição dos produtores rurais – que, em sua maioria, estão acima de 40 anos de idade – à covid-19.

Apoio, Tecnologia e Transformação

Visando gerar alternativas inteligentes e um incentivo ao desenvolvimento do setor no país, alguns órgãos já existem há décadas e fazem parte desse reconhecimento e sucesso da agropecuária que se destaca no cenário mundial, mesmo após os efeitos da pandemia.

Um dos órgãos responsáveis é a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), fundada em 1973. A Embrapa é uma empresa pública voltada à pesquisa, ao desenvolvimento e à inovação na agricultura.

O Instituto Mulheres Jornalistas entrevistou Marcelo Augusto Boechat Morandi, engenheiro agrônomo, pesquisador e chefe-geral da Embrapa Meio Ambiente

Mulheres Jornalistas (MJ): Qual o papel da Embrapa?

Marcelo Morandi: A Embrapa é vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Atua na geração de conhecimento e tecnologias para a produção de alimentos, fibras e fontes de energia. Sua missão é viabilizar soluções de pesquisa, desenvolvimento e inovação para a sustentabilidade da agricultura em benefício da sociedade brasileira. São 43 unidades de pesquisa distribuídas em todo o território nacional.

sustentabilidade-na-agropecuária
Micropropagação. Foto: Reprodução/Flickr/Embrapa

Tecnologias desenvolvidas pela Embrapa ajudam a transformar a agricultura brasileira. Até a década de 1960, o Brasil importava grande parte dos alimentos que consumia. O investimento em ciência e a atuação em rede das instituições, aliados à implantação de políticas públicas e ao empreendedorismo do agricultor brasileiro, impulsionaram o uso de tecnologia e a adoção de boas práticas no campo. Hoje, o país é referência em ciência e tecnologia para a agricultura. Tornou-se um dos maiores produtores de alimentos do mundo, capaz de exportar para cerca de 200 países.

As pesquisas da Embrapa têm foco em atender às demandas do setor produtivo, prover soluções, antecipar problemas e identificar novas oportunidades para a agricultura brasileira, e no apoio à formulação e condução de políticas públicas efetivas, sempre em sintonia com o ambiente externo e com o desenvolvimento sustentável, o que torna a Embrapa uma empresa estratégica para o Brasil.

Os dados do Balanço Social 2020 apontaram um lucro social de R$ 61 bilhões gerado a partir do impacto econômico no setor agropecuário de 152 tecnologias e de cerca de 220 cultivares desenvolvidas pelas pesquisas da Embrapa. Em resumo, para cada R$ 1,00 aplicado na Embrapa no último ano, foram devolvidos R$ 17,77 para a sociedade. São incluídos no cálculo ganhos sociais intangíveis que também resultam da atuação da Embrapa, como: aumento da produção; melhorias na qualidade dos alimentos; expansão das exportações; ampliação na oferta de fontes alternativas de energia; contribuição para a conservação ambiental e geração de conhecimentos estratégicos para o país.

MJ: Quais os efeitos que a pandemia da covid-19 gerou ao setor agropecuário?

Marcelo Morandi: Em um primeiro momento, houve imensa apreensão com a situação, especialmente com as questões logísticas de distribuição e comercialização de produtos agropecuários. Ocorreram perdas expressivas, especialmente em algumas cadeias como hortaliças e frutas. Mas, rapidamente, se verificou a essencialidade da produção de alimentos para a manutenção da segurança alimentar e essa questão foi equacionada para a maioria das cadeias produtivas.

A pandemia promoveu, por outro lado, a criação e aceleração de novos mecanismos de comercialização, especialmente por meios digitais e delivery, e também no fomento a circuitos curtos de comercialização. Muitos produtores, especialmente os menores, tiveram maior dificuldade de se adequar a este novo momento, mas, em geral, verificamos que os novos arranjos criados permitiram a manutenção e até o crescimento de muitos negócios.

Para a agricultura de maior escala, especialmente a voltada para produtos de exportação (grãos, carnes, açúcar, café), verificamos que houve grande aumento da demanda internacional, que impulsionou o aumento das exportações brasileiras.

Mas, como grande lição, a pandemia da covid-19, associada à emergência climática que vivemos, trouxe uma mudança de postura do setor financeiro, investidores, cientistas, governos, indústria, agricultores e, em grande medida, da população: o atual modelo econômico vai ter que incorporar tolerância zero com a corrupção, proteção ao meio ambiente, uso ético de informações privadas e respeito aos direitos humanos em toda a cadeia de fornecedores.

O desenvolvimento sustentável, com ações concretas de respeito ao meio ambiente, deve direcionar a retomada econômica do setor agropecuário no pós-pandemia. A agricultura sustentável não é mais uma opção, mas uma “necessidade imperativa”, sobretudo diante das evidências de mudanças climáticas. Instrumentos de bioeconomia, economia circular e economia verde devem dominar as relações de produção e consumo.

Todas as modalidades convergem para um mesmo modelo de economia, baseado em novos processos e inspirado na própria natureza, onde tudo se recicla e nada é perdido nem desperdiçado. Essa nova economia e a agricultura têm muito em comum: ambas são dependentes de sistemas biológicos e renováveis.

MJ: Por que é importante essa mudança de comportamento do setor para o meio ambiente?

sustentabilidade-na-agropecuária
Entrevistado Marcelo Morandi – Chefe Geral da Embrapa Meio Ambiente. Foto: Arquivo Pessoal/Marcelo Morandi

Marcelo Morandi: Atingimos o limite da denominada economia linear, um modelo gerador de resíduos e rejeitos em volumes e complexidade crescentes, foco de problemas em função da desconexão entre os sistemas humanos (sociedade) e os naturais (ecossistemas).

A prática, não só o discurso, de uma agricultura sustentável não é mais uma opção, mas sim uma necessidade para quem quer permanecer no negócio e para agregar aqueles, especialmente pequenos, que ainda estão fora do mercado.

Começamos a enxergar uma multifuncionalidade na agricultura na nova economia, na qual crescimento e sustentabilidade não são conceitos antagônicos, mas complementares. Uma sinergia entre economia e meio ambiente, que nos possibilita construir uma prosperidade econômica com melhorias nos planos ambiental e social.

Com a persistência da pandemia da covid-19 e sua repercussão social e econômica, o discurso do “New Green Deal” (Novo Acordo Verde) volta com força nas principais economias mundiais e com ele também a famosa sigla “ESG” (Environmental, Social and Governance) – que, em português, significa a boa governança Ambiental, Social e Corporativa, em todas as atividades econômicas.

Como já apontado por vários especialistas, o mundo pós-pandemia será dominado pela combinação de três “S” – Saúde, Sanidade e Sustentabilidade.

Sustentabilidade, portanto, deixa de ser um conceito abstrato e se transforma em um ativo, que conjuga economia, meio ambiente e pessoas na mesma equação, na qual o resultado deve ser positivo para todos.

A discussão está cada vez mais presente no ambiente corporativo, uma vez que o mundo das finanças também está cada vez mais atento ao tema. A questão ambiental não é mais apenas objeto de ativistas de diferentes espectros ideológicos. Ao contrário, os maiores líderes mundiais de negócios e investidores estão entendendo que a mudança é importante e urgente. A sustentabilidade passa a ser concreta, mensurável e precificável. Entrou definitivamente na agenda de todas as atividades econômicas.

Neste cenário, a agricultura deverá cada vez mais desempenhar atividades ambientalmente responsáveis que foquem na preservação da biodiversidade, diminuição da emissão de gases de efeito estufa e valoração dos serviços ecossistêmicos. É questão de mercado, de negócio. E diz respeito também à própria sobrevivência e longevidade do negócio.

A crescente importância da ESG nas atividades organizacionais provocará uma mudança significativa nos próximos anos. Qualquer novo padrão tecnológico terá que se nortear pela consolidação de sistemas de produção limpos, com balanço positivo de carbono, adoção de práticas de manejo de solos tropicais, investimentos na conservação e uso da biodiversidade e que integrem as cadeias, promovam a inclusão produtiva e gerem e remunerem as externalidades positivas – que são os benefícios indiretos que uma empresa gera a outras empresas e à sociedade. Ou seja, cumprir os critérios ESG. Quem não enxergar isso e se mover neste sentido terá muita dificuldade de se manter.

A boa notícia é que o Brasil tem muitas oportunidades neste “novo mundo”. Há espaço para ampliar a produção e a conservação ambiental. O Brasil está pronto para ser o maior produtor mundial de alimentos em bases sustentáveis. A agropecuária brasileira se beneficia de tecnologias para o mundo tropical, desenvolvidas a partir da década de 1970. Com o fortalecimento da ciência voltada para a agricultura, o país passou a experimentar crescimentos impulsionados por ganhos de produtividade por hectare. Nestes quase 50 anos, com mais intensidade nas últimas três décadas, enquanto a área plantada com grãos cresceu 61%, a produção aumentou 312%, cinco vezes mais. Assim, o agro brasileiro pode – e deve – desempenhar um papel ainda mais relevante no mundo, pela sua capacidade de produzir alimentos, fibras e energia em quantidade e qualidade.

Temos um arcabouço legal e de políticas públicas robusto, que inclui o Plano Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (Plano ABC), a Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio), o Programa Nacional de Solos do Brasil (Pronasolos), o Programa de Bioinsumos, o Zoneamento Agrícola de Risco Climático (ZARC), a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais recém-sancionada, a ratificação do Acordo de Nagoia sobre biodiversidade e outros marcos importantes. Sem esquecer do Código Florestal que, mesmo ainda carecendo de plena implementação, é uma baliza sem igual, que nos permite ter Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal convivendo com a área produtiva dentro das fazendas.

Depende de como vamos usar todos esses recursos naturais, tecnológicos e sociais que temos. Há oportunidades se abrindo para todos os tipos e tamanho de propriedade, desde a agricultura de base ecológica até grandes sistemas produtivos. Mas, para aproveitá-las, temos que corrigir alguns erros ainda presentes, como o desmatamento ilegal, que impacta a imagem do Brasil e do agronegócio e afeta a abertura de novos mercados externos, e a perda e desperdício de alimentos desde a produção até o consumo, que impacta no uso de recursos naturais, nos preços e no acesso ao alimento pelas populações mais carentes.

MJ: É possível implantar e sustentar esses recursos com baixo custo?

Marcelo Morandi: O grau de dificuldade de inserção neste conceito de sustentabilidade depende da situação da propriedade, do acesso a conhecimento e tecnologias e, obviamente, da capacidade de investimento e expectativa de retorno.

Há muito recurso disponível, em nível mundial, para investimentos considerados “verdes”. Porém, muitos produtores, especialmente os pequenos e familiares, não estão prontos para acessar estes recursos. Será necessário o fortalecimento de políticas públicas para ampliar este acesso, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), dentre outras.

Já a maioria dos médios e grandes agricultores brasileiros têm lançado mão de tecnologia e de inovação para garantir a melhoria dos índices de sustentabilidade dos sistemas produtivos, criando oportunidades para acesso a créditos adequados para investimentos na ampliação sustentável da produção. Neste caso, precisamos de segurança jurídica e estabilidade para fomentar esses investimentos.

A outra ponta está na capacidade do consumidor. As novas gerações de consumidores estão cada vez mais preocupadas com a responsabilidade social e ambiental das empresas que estão por trás dos seus hábitos de consumo. Uma pesquisa de 2016 da Cone Communications verificou que 75% dos millennials estão dispostos a ter um corte no salário para trabalhar em uma empresa socialmente responsável. De acordo com outro estudo, da Nielsen, 73% dos millennials pagariam mais por produtos ou soluções sustentáveis.

O problema está na atual perda de renda de significativa parte da população, que poderá retardar ou dificultar essa mudança.

sustentabilidade-na-agropecuária
Sede Distrito Federal Embrapa. Foto: Reprodução/Embrapa

MJ: Além do reaproveitamento da água e o fornecimento de energia solar, quais outros recursos sustentáveis são utilizados na nossa agricultura atualmente?

Marcelo Morandi: O Brasil já conta com uma série de sistemas e tecnologias sustentáveis que podem ser considerados estratégias verdes e tecnologias poupa-terra, em franca adoção. Tecnologias poupa-terra são aquelas que permitem incrementos sustentáveis na produção total em uma mesma área, e graças ao seu uso, evita-se a abertura de novas áreas para produção agropecuária. Caso essas tecnologias não estivessem em uso, seria preciso dedicar mais áreas à agropecuária para a necessária produção de alimentos e energia, o que conduziria a possíveis impactos ambientais negativos. Assim, as tecnologias poupa-terra contribuem sobremaneira para a sustentabilidade ambiental, econômica e social da agropecuária brasileira.

Sistemas de produção mais complexos, sistêmicos, resilientes, sustentáveis, como os de baixa emissão de gases de efeito estufa (GEE), compõem agenda de pesquisa de organizações públicas, universidades, empresas e já são práticas adotadas em larga escala no Brasil, entre os quais se destacam: integração Lavoura, Pecuária e Floresta (ILPF); sistemas agroflorestais; sistema de plantio direto (SPD) e agricultura orgânica; fixação biológica de nitrogênio (FBN); controle biológico de pragas e doenças; florestas plantadas; recuperação de áreas degradadas; tratamento de dejetos animais; recuperação, restauração e adequação ambiental das propriedades rurais.

Tem sido notável o crescimento no uso de bioinsumos, produtos de origem biológica e que promovem o controle de pragas e doenças e a boa nutrição de plantas e animais, em substituição ou racionalização do uso de adubos e pesticidas químicos. O mercado de bioinsumos no Brasil tem crescido a taxas expressivas, especialmente nos últimos anos. Atualmente, há no Brasil mais de 400 produtos registrados, sendo que 35% destes foram registrados nos últimos três anos. O mercado chegou a dobrar de tamanho na safra 2019/2020, em comparação com a safra de 2017/2018, e tem uma projeção de crescimento de 33% no ciclo 2020/2021.

Os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil em relação ao clima oferecem oportunidades também no setor de biocombustíveis e energia de biomassa. A matriz energética brasileira já contempla importante participação de energias renováveis, entretanto, para o cumprimento das metas assumidas, há clara necessidade de uma efetiva transição para economia de baixo carbono no setor de transportes, reduzindo as emissões devido à queima de combustíveis fósseis. A recente Política Nacional de Biocombustíveis – RenovaBio criou um mercado de carbono, remunerando a redução de emissões de gases de efeito estufa pela substituição de combustíveis fósseis por biocombustíveis. Em seu primeiro ano de execução (2020), foram disponibilizados mais de 14 milhões de créditos de descarbonização, que correspondem a 14 milhões de toneladas de gases de efeito estufa que deixaram de ser lançados na atmosfera. Para este ano, se espera a disponibilização de 25 milhões destes créditos de descarbonização.

O Código Florestal Brasileiro é uma legislação rigorosa e moderna, que governa o uso e proteção de terras públicas e privadas no Brasil. Esta lei federal exige que os proprietários rurais mantenham uma porcentagem da área de sua propriedade sob cobertura florestal, na forma de Reserva Legal (RL), com o objetivo de preservar remanescentes de vegetação nativa em terras rurais e conservar a biodiversidade. A porcentagem designada varia de 20% a 80%, dependendo do tipo de vegetação e da localização geográfica da propriedade. Além disso, o Código Florestal exige também a recuperação das Áreas de Preservação Permanente (APP), que incluem bordas de cursos d’água e topos de morro. O Código Florestal Brasileiro, que mesmo ainda carecendo de plena implementação é um marco sem igual em nenhum outro país e que permite conciliar Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal com a área produtiva.

Em resumo, há conhecimentos e tecnologias disponíveis para todos os tipos e tamanho de propriedade, que vão desde a agricultura de base ecológica até a intensificação sustentável em grandes sistemas produtivos. O Brasil já possui uma base de tecnologias sustentáveis e adequadas ao ambiente tropical e continua fortemente desenvolvendo novos conhecimentos e tecnologias. Para isso, a continuidade do investimento em ciência é fundamental para o país. Se pararmos de inovar, ficamos para trás, perdemos o bonde do futuro.

MJ: Esses novos recursos necessitam de mão de obra especializada? De que forma os trabalhadores rurais conseguem ter acesso a esse conteúdo?

Marcelo Morandi: Estamos em curso no Brasil, hoje, o que alguns já chamam de a “nova revolução agrícola”, expressa principalmente na intensificação produtiva sustentável, com a convergência de conhecimentos e tecnologias já disponíveis em várias áreas e setores da ciência e tecnologia, que está alterando o modo de fazer P&D em busca de soluções para os problemas agrícolas, está transformando máquinas, equipamentos e formas de produção agropecuária, e está criando o mercado agrícola digital – a agricultura 4.0 e a crescente inserção do conceito e produtos da bioeconomia no campo.

Neste cenário, a qualificação da mão de obra no campo é cada dia mais necessária. Com o incremento do uso de tecnologias cada vez mais avançadas, a qualificação é condição básica para a permanência e inclusão destes trabalhadores nos novos modelos de produção.

Algumas cadeias produtivas mais avançadas já promovem a qualificação de seus trabalhadores, por meios próprios ou por iniciativas, como os cursos do SENAR (Sistema Nacional de Aprendizagem Rural).

Por outro lado, a extensão rural é um elo fundamental no processo de disseminação e apoio à adoção de tecnologias e inovações no campo, especialmente para os pequenos produtores que não dispõe de outros meios ou recursos para terem acesso ao conhecimento e à informação. A capilaridade da extensão rural permite a disseminação e multiplicação das tecnologias. Portanto, a recuperação do sistema de extensão rural no Brasil, em grande parte extinto ou enfraquecido na maioria dos estados brasileiros, é essencial para a inclusão produtiva de um grande contingente de produtores rurais que hoje estão à margem de todo o progresso alcançado pela agropecuária brasileira.

 O Brasil tem o potencial de ser exemplo global de como a crescente demanda por produtos verdes pode impulsionar, com sucesso, a produção agrícola sustentável. Este caminho também pode contribuir para o alcance dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). Examinado o conjunto dos ODS, fica evidente o papel que a agricultura sustentável tem para o avanço da Agenda. No Brasil, a importância da agricultura para o alcance desses objetivos é ainda maior, considerando a extensão das áreas ocupadas com lavouras e pastagens, o expressivo contingente de produtores e trabalhadores envolvidos no agronegócio e a relevância do setor para o desenvolvimento econômico e a melhoria do bem-estar social da população.

Já provamos que produzir e preservar é possível. Em 2030, podemos ser o maior produtor mundial de alimentos e, ao mesmo tempo, ser um país com imensa área preservada, a maior do mundo tropical. Para isso, precisamos valorizar nossa agricultura, melhorar a imagem do país no cenário internacional e investir na diversificação dos sistemas produtivos, fortalecer as cadeias de valor, viabilizar estratégias de pagamento por serviços ambientais e investir na formação profissional. Podemos e devemos zerar o desmatamento, acabar com a ocupação ilegal de terras públicas, defender as áreas protegidas e aprofundar os ganhos de produtividade.

“A sustentabilidade é uma jornada, não um episódio”, como afirmou Tensie Whelan, diretora do Centro de Sustentabilidade da NYU Stern School of Business. Mas, trilhar essa jornada só é possível com conhecimentos e tecnologias que permitam o melhor uso dos nossos recursos naturais. E para pavimentar esse caminho, é necessário investir de forma consistente. Esse foi o combustível que nos trouxe até aqui e que pode nos levar mais adiante, de forma competitiva. Tomo a liberdade então de acrescentar um quarto “S” às prioridades para a pós-pandemia: Science – aqui em inglês, denotando também sua universalidade. Esse quarto elemento que é transversal às dimensões de Saúde, Sanidade e Sustentabilidade, nos permitirá alcançar os almejados objetivos. Nenhuma nação se sustenta no longo prazo sem investir em ciência.

As regras do jogo estão postas. Teremos uma nova oportunidade para mostrar vantagem competitiva e consolidar o Brasil como a potência agroambiental que podemos ser. Temos que fazer as escolhas certas.