Por Giselle Cunha, Jornalista- RJ
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Diretora de jornalismo: Letícia Fagundes, Jornalista
Chefe de reportagem: Juliana Monaco, Jornalista 
Editora de conteúdo – Site MJ: Beatriz Azevedo, Jornalista

Conheça a história desta data e os tipos de violências praticadas contra a classe.

Menina, guerreira, garota, guria, moça, senhora, patroa, madame e por aí vai… Existem tantas maneiras de se referir a elas que são as personagens principais dessa data comemorada internacionalmente. Um dia em que todas as lembranças e demonstrações de carinho são válidas, porém vale ressaltar que essa data foi resultado após décadas de sofrimentos e protestos para melhores condições de vida e trabalho para a classe.

Origem

Entre os séculos XIX e XX, surgiram movimentos feministas na Europa e nos Estados Unidos que reivindicavam por condições dignas de trabalho e uma maior qualidade de vida. Durante a Segunda Conferência Internacional das Mulheres Socialistas, em agosto de 1910, uma líder socialista natural da Alemanha, chamada Clara Zetkin, sugeriu que então fosse realizado anualmente uma celebração pela luta das mulheres atuantes no mercado de trabalho. No ano de 1975, a Organização das Nações Unidas (ONU) instituiu como o Ano Internacional da Mulher e o dia 8 de março, a partir daí, foi atribuído ao movimento. O objetivo da comemoração era lembrar as conquistas sociais realizadas e as ainda necessárias, independente da nacionalidade, da étnica, da cultura, da economia ou política.

A tragédia que ocorreu em março de 1911 numa fábrica de roupas nos Estados Unidos, chamada Triangle Shirtwaist, foi o marco inicial das manifestações. A empresa era constituída por uma média de 600 funcionários, na sua maioria composta por mulheres imigrantes judias e italianas. Mulheres que trabalhavam cerca de 14 horas diárias e ganhavam até 10 dólares semanais. No incêndio, morreram 146 pessoas, dentre eles 23 homens e 123 mulheres.  O foco inicial do fogo ocorreu no nono andar, onde dispunham apenas de duas saídas e ambas ficavam trancadas para evitar que as operárias fizessem pausas durante o expediente e furtassem materiais.

Mulheres Reais

Ganhando cada vez mais espaço em cargos antes dominados por homens, as mulheres têm mostrado suas competências e jogo de cintura para as situações mais inusitadas. O Instituto Mulheres Jornalistas entrevistou 3 mulheres que trabalham, cuidam da sua família e de seus filhos (sejam eles de 4 patas ou não), que representam bem a rotina e a superação no cenário feminino.

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Entrevistada Luciana Reis. Foto: Julio Salvo

Luciana Reis é perita contábil e seguiu em busca do seu crescimento profissional: “Resolvi abrir meu negócio quando me deparei com a situação de que do ponto que eu estava eu não cresceria mais. Estava estável, tinha um bom salário, mas queria mais! E naquele momento, não pensei em procurar um novo emprego, pois sabia que a insatisfação novamente iria me bater. Então pensei: porque não buscar meu lugar no mundo, criar meu negócio, encarar os medos, frustrações e pensar ‘eu tentei!’ Se desse certo, bem! Se não desse, não teria a impressão do ‘e se?’. São muitos os desafios, mas destacando, mulheres são mães, são esposas, e conciliar tempo de trabalho e família é desafiador, pois o mercado busca pessoas focadas em suas tarefas. Então, se é necessário ficar até 22h trabalhando, para mulheres com famílias sempre é difícil e sempre vi isso como um ponto de torção de nariz, pois os homens têm a imagem da ‘liberdade’, a imagem dos provedores, mas as mulheres também são. A diferença é que acumulamos funções, e isso não é ser feminista, é que temos a capacidade de fazer mil coisas ao mesmo tempo e isso faz parte de nossa natureza. Conseguir espaço em mercados tão masculinos é o grande desafio!”, explica a sócia proprietária da empresa Reis Cálculos Periciais.

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Entrevistada Dra Regina Caramuru. Foto: Julio Salvo

Nossa segunda entrevistada é a Dra. Regina Maria Caramuru, que atua na medicina há mais de 40 anos em São Paulo e é sócia fundadora da empresa Trabt Medicina e segurança do trabalho. ”Terminei o curso de Medicina na PUC/SP em Sorocaba no ano de 1978 e minha primeira especialização foi a Residência Médica na Faculdade de Medicina de Sorocaba em Pediatria. Mas como eu exercia atividades médicas na cidade de Salto de Pirapora e Pilar do Sul, fora a pediatria, exercia clínica geral pela necessidade local. Trabalhava nesta ocasião na Prefeitura, onde fundei o primeiro ambulatório médico e em Pilar no Sindicato Rural. Mantinha ainda meu consultório médico em Salto de Pirapora e Sorocaba e ainda plantões semanais no Pronto Socorro do Hospital Santa Lucinda em Sorocaba. No consultório, atendia também um convênio e, após a fundação do Hospital deste convênio em específico, dava plantões na Pediatria, Pronto Socorro Infantil, Berçário e Neonatologia no Centro Obstétrico. Após cerca de 10 anos, com 3 filhos pequenos, decidi mudar o rumo de minha profissão pelas dificuldades de conciliar tudo isso com a minha vida familiar de mãe. Surgiu a oportunidade de um emprego para médico do trabalho em uma pedreira em Salto de Pirapora. Prestei um concurso na Santa Casa de São Paulo pela Fundacentro para formações em Medicina do trabalho e fui aprovada, com sacrifício obtive essa nova formação. Realizei ainda o curso de formação de Perita de Trânsito, a seguir passando a atender exames médicos para condutores veiculares. Nesta época, ainda surgiu a oportunidade de ser médica pediatra no Centro de Convivência Infantil da Polícia Civil, mas como dependia de concurso público para médico legista, vi a oportunidade de que caso aprovada pudesse assumir a creche infantil. Fiz o concurso e fui aprovada. Tive, inclusive, de fazer o curso na academia de Polícia em São Paulo na Cidade Universitária (teórico e prático). Após findar a especialização como médica Legista, passei a trabalhar na creche da Polícia mas, por carência de legistas, tive de assumir como tal, inicialmente na área de violência às mulheres e crianças, pois eu sendo mulher tais vítimas teriam maior conforto com o meu atendimento. Não consegui conciliar a creche com o serviço do IML, então precisei assumir também os serviços noturnos e necropsiados. Foi uma escolha difícil, mas o destino me levou para a área pericial e investigativa. Acabei por abraçar a área pericial como médica legista, perita judicial em processos trabalhistas, medicina do trabalho e medicina do trânsito, pois eram enfim áreas correlatas e que passei a gostar”.

Dando continuidade, nossa terceira integrante desse grupo de mulheres de sucesso, conversamos com a médica veterinária Vanessa Zimbres: “Abri a empresa em 2009 e, no início, me dedicava integralmente a ela. Após 8 anos, expandi minha clínica e voltei a me dedicar novamente de forma integral. Posso afirmar que hoje vivo para meu trabalho, mas amo o que eu faço. Como não tenho filhos e moro sozinha, me permito ficar mais na clínica do que em casa, considero meus pets como filhos e eles ficam na minha clínica comigo. Justamente por isso, quando construí o novo prédio da minha empresa, construí também um espaço, uma quitinete, para que eu pudesse me sentir em casa mesmo dentro da empresa. Mas a profissão de médico-veterinário exige muito do nosso tempo e, infelizmente, isso é algo que estou trabalhando para conciliar e ter mais dias de folga ou mesmo finais de semana livre que, no momento, e por minha escolha, não estou conseguindo ter. Tenho uma clínica veterinária exclusiva para gatos, projetada de acordo com as normas internacionais de ‘clínica amiga do gato’ e somos certificados internacionalmente com o selo “Gold Cat friendly practice”, considerado o maior nível de excelência no atendimento de gatos. Na época, a medicina felina era algo que mal se abordava nas universidades. Além disso, quando somos funcionários, temos que seguir as regras da empresa, e eu discordava em muitas coisas, seja no atendimento ao cliente ou até mesmo o tratamento com os próprios animais, principalmente os gatos. Portanto, uma vez que não consegui moldar o comportamento da equipe, preferi tentar fazer as coisas do meu jeito. Eu sempre conto que quase desisti da faculdade por sofrer bullying dos colegas por gostar de gatos e, por incrível que pareça, isso acontece até hoje quando dou aulas ou palestras para colegas veterinários que não simpatizam tanto com a espécie! Quando saí dos meus empregos, e sempre trabalhei em dois lugares ao mesmo tempo quando jovem, até minha família não acreditou muito que a dedicação somente aos felinos poderia dar certo. Acharam que a clínica não ia pagar as contas, que eu ia me frustrar e, mesmo assim, fiz meu sonho dar certo! Abri a 5ª clínica veterinária exclusiva para gatos no Brasil e hoje somos referência! Fruto de exaustivo trabalho e dedicação.”, se orgulha em declarar.

Histórias de superação e muita dedicação, mas não é só de triunfos que se constrói uma trajetória, ambas também tiveram que enfrentar dúvidas e questionamentos sobre sua capacidade profissional. “Certa vez, fui realizar uma visita numa empresa e o cliente achou que eu fosse a estagiária e que o Perito estaria a caminho. Na ocasião, disse que não e o cliente se assustou quando me apresentei sendo a contabilista que iria trabalhar no processo dele. Percebi um certo incomodo, por ser mulher e também na época por ser mais jovem (estava com 27 anos, ou seja, 13 anos atrás). Mas, o interessante dessa situação é que, ao iniciar a reunião sobre os trabalhos que iam ser realizados e toda a solução que estávamos levando para a empresa por meio dos cálculos, unido aos trabalhos jurídicos que os advogados estavam fazendo, o cliente ficou mais surpreso ainda com a capacidade e conhecimento que eu possuía. Enfim, reduzimos uma dívida de 5milhões para 700mil reais! Creio que ele esteja feliz até hoje“, lembra a Dra. Regina Maria Caramuru.

“Já tive experiências desagradáveis por ser do sexo feminino. Logo que terminei o curso de Medicina do Trabalho e me preparei para tentar a vaga de emprego na referida pedreira em Dalto de Pirapora, recebi a resposta de que ali não era lugar para mulher. Me senti frustrada, porque após tanto esforço, fui barrada do prometido serviço. Mas surgiram outras oportunidades. Não desanimei. Mesmo como médica legista, verifiquei que, na época, eu era a única pois as próprias médicas não procuravam por temer uma reprovação. Ficou provado nos 25 anos que lá trabalhei que podemos fazer tudo que um homem faz e ainda mais quando acolhemos vítimas que podem ser melhor compreendidas ese sentirem mais seguras por outra mulher. No início de meu trabalho, participei e lutei para o atendimento hospitalar dessas mulheres necessitadas de ambiente seguro e adequado. A palavra da profissional médica foi bem aceita quando bem colocada”, diz Caramuru.

“Infelizmente, já tive diversos episódios desagradáveis, justamente por isso aprendi com minha mãe a depender cada vez menos de serviços dito ‘masculinos’. Era um absurdo quando chamava alguém para trocar um chuveiro, consertar uma torneira, furar uma parede. Minha mãe aprendeu a fazer tudo isso e ainda mais, e o que não aprendi com ela, aprendi sozinha. Teve uma ocasião que precisei cortar um piso, porque o pedreiro não estava entendendo o que eu queria e ele começou a rir, dizendo que a ferramenta usada não era coisa de mulher e eu iria ‘machucar minha mãozinha’. Fiquei com raiva, cortei e ensinei o cara a fazer do jeito que eu queria.

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Entrevistada Dra Vanessa Zimbres. Foto: Julio Salvo

É visível quando estamos furando uma parede, cortando uma madeira, consertando um fio elétrico, o espanto no rosto de qualquer um que esteja perto. E, apesar disso tudo, nós continuamos a ser delicadas, educadas, gentis e femininas. Quando abri meu negócio, tudo era mais complicado: desde a reforma/construção do prédio, quando os prestadores de serviço nos julgam ingênuas, que mulher não entende de obra, empurrando materiais mais caros, serviços mais caros etc. Depois veio a negociação na compra de produtos, muitos me tratavam como se eu não tivesse nem a capacidade de fazer uma conta. Claro, uma minoria, mas temos que ficar sempre armadas contra golpes e acabamos por desconfiar de todos. E negociar com outras mulheres é mais fácil, pois certamente elas já passaram ou passam pelo mesmo que nós”, desabafa a veterinária especializada em felinos, Vanessa Zimbres.

Há muitos anos, as mulheres assumem a responsabilidade financeira dos lares, mas ainda assim podemos acompanhar relatos como esses. De acordo com uma pesquisa realizada pelo IBGE, ainda no ano de 2010, 37% dos lares brasileiros já eram sustentados financeiramente por mulheres, sendo 87% delas responsáveis sem cônjuges, mas com filhos.

No último relatório da Global Gender Gap Report (Relatório Global sobre a Lacuna de Gênero) do Fórum Econômico Mundial, o Brasil ocupa a 130* posição em um ranking composto por 153 países quando assunto é igualdade salarial entre homens e mulheres que exercem funções semelhantes. É discrepante a desigualdade, o preconceito e a desvalorização do trabalho feminino.

Violência sem fim

Desde as primeiras manifestações, questões como melhores condições de trabalho, igualdade salarial e punições mais severas para crimes de feminicídio são levantadas. O ano de 2021 foi marcado pelo segundo maior número de denúncias referentes à violência doméstica dos últimos 12 anos. De acordo com a Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF), foi contabilizado que uma média de 44 mulheres sofreram algum tipo de agressão por dia.

Os números impressionam, segundo um levantamento comparativo por estados realizado pelo portal Atlas da violência, que é administrado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). É possível perceber como a violência contra a mulher aumentou e se alastrou em números significativos por todo o país.

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Imagem: Divulgação/IPEA/Atlas da Violência

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o impacto da violência na saúde e no bem-estar da mulher podem ser depressão, estresse pós-traumático, ansiedade, suicídio, depressão pós-parto e até transmissão de infecções e AIDS.

Tipos de violências sofridas pelas mulheres

Violência psicológica

São atos e falas que desequilibram a mulher emocional e psicologicamente. Diminuir a sua autoestima, controlar o que ela faz, com quem faz ou deixou de fazer. Controlar suas decisões, de modo a proibi-la de estudar, seguir carreira profissional e adquirir independência financeira. Essas atitudes não podem ser confundidas com cuidado e zelo pela mulher. A imposição sobre as decisões da mulher pode acontecer por meio de discursos carinhosos, mas também por meio de humilhação, isolamento, ameaças, vigilância constante, chantagens, ofensas, ou seja, atitudes que prejudicam a saúde mental da mulher.

Há também o termo gaslighting, que define ações manipuladoras que um homem utiliza para fazer a mulher se sentir desequilibrada, incompetente ou louca, levando-a duvidar de seus pensamentos e posicionamentos. É um abuso psicológico, em que informações são distorcidas a favor do homem ou simplesmente com a intenção de fazer a mulher duvidar de sua memória, sanidade e percepção.

Violência física

Qualquer ato que reprima a mulher, utilizando a força física. Os tipos de violência física variam de puxões de braço, de cabelo, empurrões, até socos e espancamentos. As consequências físicas e psicológicas tornam-se evidentes na vida da mulher. Ela enfrenta o medo de denunciar a situação, insegurança consigo mesma e com as outras pessoas e tende a se isolar, devido ao receio de não acreditarem na sua história. Pode sofrer hematomas, ter ossos quebrados, fraturas, sangramentos internos, perda do filho em casos de gravidez e até causar a sua morte.

Feminicídio

É o homicídio contra uma mulher porque ela é mulher. É considerado feminicídio o crime em que estiver envolvida a violência familiar e doméstica, o menosprezo e a discriminação à condição de mulher. Isso porque 35% dos homicídios de mulheres no mundo são cometidos por seus parceiros, segundo a Organização Mundial da Saúde.

A lei 13.104, mais conhecida como Lei do Feminicídio, considera crime hediondo, ou seja, o Estado entende como um crime grave e cruel. A lei tipifica de um crime de discriminação, de preconceito e menosprezo da condição feminina.

Violência sexual

Atos ou tentativas de relação sexual sem o consentimento da mulher, normalmente feitos de formas violentas ou sob coação. Violência sexual é abuso, assédio e estupro. Pode ser cometida tanto por pessoas desconhecidas como por pessoas conhecidas. Segundo pesquisas do Ipea, 70% dos estupros são realizados por conhecidos da vítima ou com quem mantêm algum tipo de relacionamento. Os atos englobam quaisquer tipos de relação sexual até, por exemplo, proibir a mulher de utilizar anticoncepcionais, não utilizar contraceptivos contra a vontade dela, obrigá-la ou impedi-la de abortar.

Violência doméstica

Normalmente, engloba todos os tipos de violência falados anteriormente. É uma violência velada ou explícita que acontece, literalmente, dentro de casa. Em se tratando de violência doméstica contra a mulher, ela acontece em quaisquer faixas etárias, podendo ser quando ela é criança e/ou adolescente,adulta ou até mesmo idosa.

Ainda que seja comum ouvir o ditado “em briga de marido e mulher não se mete a colher”, como uma tentativa – errada – de apaziguar atritos, é necessário estar atento aos sinais de violência sofridos em casa. Esse tipo de discurso deslegitima a mulher que denuncia o abuso sofrido. Segundo dados do Instituto Avon sobre a violência doméstica contra a mulher, 2 milhões de mulheres no Brasil são vítimas desses abusos por ano. A pesquisa revelou que apenas 63% delas denunciam a agressão. O medo em denunciar pode partir tanto do desamparo financeiro, como o marido ameaçar tirar seus filhos ou até por conta de ameaças de morte.

Fonte: https://www.fundobrasil.org.br/blog/violencia-contra-a-mulher-como-identificar-e-combater/

Canais de denúncia

O Disque 180 é o principal canal nacional para prestar queixas. Também é possível ligar para o 190, em casos de flagrantes, e para o 181, que recebe denúncias anônimas no âmbito estadual. Para mulheres com medidas protetivas, acione a Patrulha Maria da Penha através do 153.